Uma nova astrologia

O José Prudêncio, professor de filosofia e astrólogo, publicou um livro sobre astrologia, onde diz que a astrologia pode ser objecto de investigações académicas e de uma metodologia rigorosa. Não há dúvida que sim e que os estudos académicos sobre o assunto mostram sempre que a astrologia não tem qualquer sustentação nas influências e resultados que prevê.
Mas o José Prudêncio acha que não, embora no livro não apresente um único estudo credível para confirmar as suas teorias. No fundo, estamos perante uma grande salada de filosofia e astrologia. Mas vejam para depois comentar.
Já agora o José Prudêncio costuma participar no programa Praça da Alegria da RTP1 (com Jorge Gabriel) e diz que é mestre (o que não duvido) em Cultural Astronomy and Astrology. Como se pode ver pelo curso em questão trata-se de uma escola de astrologia. Já agora reparem no equipamento astronómico. O que é que estes astrólogos vão fazer com um refractor de 60 mm?

Mas o livro tem mais do que parece à primeira vista. Tem uma proposta para uma nova astrologia. Não é que tenha ficado seduzido pela proposta, mas o livro tem coisas interessantes.
Ao ver o livro não é difícil perceber que o autor conhece bem as concepções filosóficas e culturais da astrologia e também as contradições e as limitações do próprio sistema. E é por ter tomado consciência dessas limitações e contradições, que Prudêncio decidiu inventar um novo sistema astrológico, a chamada astrofilosofia, que no fundo é um cocktail de filosofia e de astrologia.
Mas digno de registo (pela sinceridade) é que Prudêncio reconhece que a astrologia não é uma ciência, e que provavelmente não tem qualquer fundamento científico e que na verdade não é mais do que uma técnica de linguagem usada para resolver problemas pessoais. Ora, perante isto é espantoso que depois Prudêncio adopte como base conceptual da sua nova filosofia, a mesma base conceptual da astrologia, ou seja, as posições planetárias, que o próprio reconhece não terem uma base física ou porventura não corresponderem a uma influência real. Ou seja, entra em completa contradição. Ou melhor dizendo, é como ser padre sem acreditar em Deus.
No novo sistema de Prudêncio (a astrofilosofia) percebe-se que continua a considerar que as três coisas mais importantes na astrologia são a hora do nascimento, o local e a data do mesmo, pois partindo da data, da hora e do local pode-se calcular a posição exacta dos planetas na altura do nascimento. Esquece-se que qualquer pretensa influência planetária sobre a Terra seria praticamente a mesma em qualquer lugar (o que torna irrelevante o local) e que antes de nascer já somos um ser dentro do útero materno e que qualquer influência planetária já se devia sentir aí. E que o sistema solar, além de planetas e da Lua, tem cometas, asteróides, luas de outros planetas, trans-neptunianos e o próprio Sol, que também deviam entrar nessas cartas astrológicas. E que a influência da Lua sobre as marés é gravitacional e que pode ser calculada facilmente sobre o corpo humano, não tendo qualquer influência subtil em nós.
O livro é vasto e adivinha-se que nasceu dos estudos que o autor fez em Inglaterra no âmbito de um curso sobre astrologia cultural. Teria sido interessante reportar-se unicamente à evolução cultural da astrologia, sem querer inventar um novo sistema. Mas Prudêncio é um astrólogo praticante e consciente das contradições da astrologia convencional tentou conceber um sistema com menos contradições. O problema é que o sistema conceptual da astrologia não tem fuga possível a não ser abandoná-lo completamente. Aliás, no livro aparece o exemplo, de alguns astrólogos australianos, que abandonaram a astrologia por perceberem que as previsões astrológicas tanto funcionavam para as pessoas de uma forma, como da forma completamente contrária, o chamado efeito arco-íris. A partir daí perceberem que a prática astrológica não tinha qualquer coerência. Prudêncio preferiu um caminho diferente. Muito bem. Mas faz-me lembrar um padre que descobre que se calhar Deus não existe, mas como gosta da profissão continua a exercer. Parece-me ser o caso de Prudêncio, que não quis deixar a paixão da juventude. Mas achei interessante o livro e recomendo pela abordagem crítica que faz da astrologia convencional.

3 comentários

  1. Boa tarde,

    Gostaria de uma informação, já peço desculpa se o assunto foge um pouco.

    Mas é que por morar em cidade pequena não temos cursos relacionados a coisas mais misticas.

    Diante disso, encontrei um curso de quirologia online, só que queria saber se poderia confiar nos ensinamentos de um curso dessa modalidade sendo ministrado online.

    Caso alguém possa me dar sua opinião eu agradeço, vou deixar o site onde fala do curso.
    (… link editado…)

    Desde já obrigada

    Att,
    Kátia

    1. É uma vigarice em que os antigos acreditavam porque não tinham conhecimentos para saber que estavam a ser vigarizados.

      Atualmente, é só mais uma forma de roubar dinheiro às pessoas que estejam emocionalmente frágeis.

      http://skepdic.com/palmist.html
      http://www.skepticink.com/gps/2013/10/14/palm-reading-science-or-pseudoscience/

  2. RESPOSTA A UM CRÍTICO APRESSADO… MAS HONESTO

    Caro José Matos.

    Quero agradecer a crítica que fez ao meu livro.

    Você, naturalmente, começou com os pré-conceitos habituais e as opiniões magistrais sobre um livro que não tinha lido… só pelo facto de ver nele a palavra “astrologia”.

    Compreendo a sua precipitação. Aliás, como viu, concordo consigo: noventa e nove por cento do que aparece sob a designação de “astrologia” é de evitar.

    No entanto, verifiquei com agrado que teve a honestidade rara de ter reconhecido que se tinha precipitado na crítica espontânea que fez do livro.

    Ao ler um pouco, descobriu que “o livro tem mais do que parece à primeira vista”, “tem coisas interessantes”, “achei interessante o livro e recomendo”.

    Ainda assim, quando critica negativamente o livro dizendo que o meu sistema, a AstroFilosofia, é contraditório porque não existem influências planetárias, continua a mostrar que não compreendeu o alcance das minhas ideias.

    Eu não falo de influências planetárias, nem preciso que elas existam para produzir um discurso coerente sobre questões humanas concretas em contextos específicos.

    Quando digo que a “AstroFilosofia é um discurso sobre o tempo e os instintos”, uma “Filosofia de Orientação e Previsão” que só tem sentido num contexto intersubjectivo, tanto dá que eu use a posição e os movimentos dos planetas num sistema de referência convencional, como o voo dos pássaros ou a matrícula dos automóveis que passam na minha rua.

    Usei e renovei o antigo sistema conceptual da astrologia grega porque este é um sincretismo da Filosofia Grega, que condensa em si um conjunto de referências que configuram e orientam a nossa forma de pensar e de interpretar aquilo a que gostamos de chamar “a realidade”, e que eu prefiro chamar “realidades”.

    Aceito que isto não seja assim tão fácil de compreender…

    Não tenho dúvidas que se continuar a ler com um espírito aberto e atento, se reflectir sobre a dimensão das questões que este livro levanta… o céu será o limite!

    José Prudêncio

    Astrologia & Filosofia – um discurso sobre o tempo e os instintos.

    Esfera do Caos Editores, Lisboa 2008

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