Haverá na Galáxia mais Titãs do que Terras?


O hemisfério norte de Titã visto pela Cassini em cores naturais.
Crédito: NASA/JPL/Space Science Institute.

Foi recentemente publicado um interessante artigo na revista Planetary and Space Science que se debruça sobre as condições que favorecem a presença de metano líquido em planetas e luas fora do Sistema Solar. Os autores Ashley Gilliam e Chris McKay começam por enumerar as condições ambientais actualmente existentes em Titã, para definir, em seguida, as regiões nas órbitas das anãs vermelhas onde estas se pudessem manter estáveis.
Titã é um caso curioso no Sistema Solar. Junto à superfície, a maior lua de Saturno apresenta temperaturas e pressões atmosféricas que rondam, respectivamente, os 94 K e as 1,4 atm – condições próximas do ponto triplo do metano. A sua atmosfera é composta por mais de 90% de azoto, cerca de 5% de metano, e uma pequena mas importante fracção de compostos orgânicos opacos à luz visível, mas transparentes à radiação em comprimentos de onda no infravermelho. Esta última particularidade gera em Titã um eficaz efeito anti-estufa, uma vez que, em contraste com o que acontece na Terra, a atmosfera titaniana bloqueia a entrada de grande parte da radiação solar, mas permite o escape do calor da superfície para o espaço.


Ontarius Lacus, o maior lago de metano do hemisfério sul de Titã. Esta imagem captada a 12 de Janeiro de 2010 pelo radar da sonda Cassini, mostra não só os contornos definidos deste grande lago, mas também alguns rios serpenteando em direcção às suas margens.
Crédito: NASA/JPL-Caltech.

Comparadas com o Sol, as anãs vermelhas são estrelas mais frias e menos luminosas, pelo que qualquer planeta com condições semelhantes às da Terra (em particular, a presença de água líquida capaz de suster uma biosfera semelhante à nossa), teria de se encontrar a distâncias muito curtas da sua estrela – distâncias suficientes para que o efeito de maré obrigasse o planeta a manter a mesma face voltada para a sua estrela. O resultado seria, certamente, a formação de extremos ambientais nos dois hemisférios, condições inóspitas para o florescimento da vida como a conhecemos.
No entanto, apesar da sua fraca luminosidade, as anãs vermelhas emitem uma fracção de luz infravermelha consideravelmente superior à do Sol, a mesma luz que consegue penetrar na densa neblina de compostos orgânicos presente na atmosfera titaniana. Partindo deste presuposto, Gilliam e McKay analisaram as alterações na superfície da lua Titã, se esta fosse colocada na órbita de uma estrela anã vermelha, a uma distância corresponde àquela em que estaria exposta ao mesmo fluxo de radiação infravermelha recebido do Sol na sua actual posição no Sistema Solar. Verificaram que, dentro das possíveis variações de actividade existentes nas anãs vermelhas, planetas do tamanho de Titã manteriam condições favoráveis à presença de metano líquido na sua superfície a distâncias entre 0,24 a 0,52 UA. Curiosamente, se o tamanho desses planetas fosse superior ao de Titã, a distância à sua estrela hospedeira poderia aumentar consideravelmente, devido ao previsível aumento do fluxo de calor interno. Para o caso particular da famosa anã vermelha Gliese 581, Titã poderia manter os seus lagos de metano líquido a uma distância de 1,66 UA!
Tendo em conta que as anãs vermelhas são as estrelas mais abundantes na Via Láctea, conclui-se de imediato que poderão existir mais planetas ou luas semelhantes a Titã do que objectos com ambientes terrestres.
Poderá a vida surgir em condições semelhantes às de Titã? Quem sabe? Talvez a nossa procura por vida devesse considerar essa possibilidade…

11 comentários

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    • Carlos Eduardo Santos on 31/05/2011 at 20:22
    • Responder

    Hummmmm, então se colocarmos fogo neste lago ele queima/explode?
    Não entendo estes planetas cheios de metano ter vida…
    Vou pesquisar mais sobre ele.

    1. As coisas costumam arder na Terra devido ao oxigénio 😉

      Sim, é possível haver vida baseado no metano… em vez de água, pode ser metano líquido 😉

      Titã é uma lua do planeta Saturno 😉

        • Carlos Eduardo Santos on 31/05/2011 at 20:28

        Então estas luas não tem oxigenio?interessante.
        Mas sem oxigenio fica um pouco remoto a probabilidade de vida certo?Ou existe outro modo de existir vida sem oxigenio?

        abçs

      1. Como eu disse num comentário anterior:

        “Hoje sabe-se que existem extremófilos que não precisam de oxigénio para nada, e até se sabe que a 1ª vida na Terra não queria oxigénio para nada (aliás, para eles, oxigénio era venenoso).”

        Logo, mesmo na Terra, há vida que não precisa de oxigénio. 😉

    1. Ah sim! sei, sei inclusive que as condições lá são suficientes para que o carbono possa se formar de modo a criar molecuals mais complexa como hidrocarbonetos, porem como disse acima, entre ele conseguir criar uma bacteria unicelular e ele conseguir criar uma planta há uma grande diferença. Veja bem, com meu comentario não procurei excluir a possibilidade de vida, e sim excluir a possibilidade de vida complexa. Tanto que se tais condições fossem o bastante para a vida complexa veriamos praticamente em todo sistema solar “homenzinhos verdes” xD.

      1. Sim, Titã está cheia de hidrocarbonetos.

        Claro que vida complexa é muito mais difícil.
        Tal como a existência da 1ª vida será difícil.

        Mas eu não excluo essa existência só pelo factor carbono, porque a vida tem provado que consegue ter “soluções imaginativas”.

        Nós é que estamos, para já, limitados ao que vemos na Terra 🙁
        E só por um único sítio, não se pode retirar grandes conclusões 🙁

        • Denis on 30/04/2011 at 22:23

        É meu caro colega Carlos, sou obrigado a dar o braço a torcer pra ti! xD
        Sempre tive por meta na ciencia não duvidar de nada, e apenas questionar e entender sem impor barreiras, tantos cientificas quanto morais e vc me fez ver que embora tenha essa mentalidade, ainda pratico erros crassos da maioria das pessoas que estudam o assunto: “Se aqui é assim, lá fora tambem tem que ser”. Vc disse tudo: Estamos isolados em um planeta e aqui as coisas são assim e supomos que a quimica e fisica obrigatoriamente tem de ser assim porque aqui é assim, e com isso levanto uma barreira em torno do assunto me baseando em um unico sitio e na verdade isso aqui não é nada se comparado com o resto do universo. Valeu pelo toque 😉
        Realmente vc está absolutamente certo, não sabemos se a vida pode progredir com “soluções imaginativas” ou não, ainda é muito cedo pra ddizer que sim ou que não, ainda estamos aprendendo!
        Vou me policiar mais :X

      2. Olá,

        Quando falei em soluções imaginativas, estava a pensar na Terra. Há vida para “todos os gostos”. É certo que sob uma estrutura igual para quase todos, onde o carbono evidentemente é muito importante, como o Denis referiu.

        Eu só não quero cometer o mesmo erro que por exemplo se cometia há 100 anos atrás. Olhava-se para nós, não se conheciam extremófilos, por isso imaginava-se que quer na Terra quer no resto do Universo, só poderia haver vida em sítios que tivessem oxigénio.
        Ou seja, impunha-se esse limite, só porque olhavamos para nós, e pensava-se que os outros tinham que ser assim.

        Hoje sabe-se que existem extremófilos que não precisam de oxigénio para nada, e até se sabe que a 1ª vida na Terra não queria oxigénio para nada (aliás, para eles, oxigénio era venenoso).

        Perceber a história da astrobiologia é essencial para não cometermos os mesmos erros, mesmo dando-lhe outros nomes.
        Infelizmente, o que se vê mais na população (e muitas vezes no pensamento científico) é a repetição das mesmas ideias erradas.
        Carl Sagan chamava-lhes Chauvinismos Humanos. Eu chamo-lhe geocentrismo psicológico – continuamos a pensar que somos especiais, que estamos no centro do Universo.

        abraço

  1. Realmente eu creio que a existência de vidas em corpos celestes similares a titã, no máximo, pode-se a relacionar a uma célula, isso SE tal célula conseguir se formar e JAMAIS teremos formas de vida mais complexas que isso!
    Por que sou tão cético em relação a vida complexa em ambientes inospitos? Simples: toda e qualquer forma de vida complexa no universo, na minha opinião, deverá ser obrigatoriamente ser formada UNICA E EXCLUSIVAMENTE POR CARBONO. O carbono é o unico elemento quimico na tabela periódica que tem condições de formar cadeia longas de compostos, todos os demais não! O sílicio fica em segundo lugar, porem a cadeia do silicio não é tão longa quanto a de carbono. O carbono e mais nenhum outro tem condições de formar vida complexa! Então obrigatoriamente, pelo menos todas as formas de vida complexas, tem de serem formadas por carbono. E como elemento químico o carbono está sujeito às condições limites de temperatura e pressão para que possa interagir com outros elementos formando a vida, portanto, tais condiçoes limites devem ser obedecidas em qualquer parte do universo independente do corpo celeste! Tentar construir uma forma complexa de vida sem carbono é como tentar fazer um prédio do tamanho do Empire States de isopor! Ele podem dar origem a seres estranhos como por ex a bacteria recem encontrada que se alimenta de arsenio! Ela pode se alimentar de arsênio, ter uma forma biologia até que aberradora, MAS SUA BASE É CARBONO! Ela é feita por carbono, não tem jeito! é só analisar as caracteristicas do carbono e dos outros elementos quimicos gente! Sem carbono não existe possibilidade de construções de formas muito complexas de vida!A mesma quimica que domina nosso planeta domina todo universo! Titã é fria demais, como o carbono se comporta nas caracteristicas de titã? Bingo! Só analisar a forma de como o carbono se comporta naquela temperatura e pressão que a gente vai saber se ele tem condições de formar vida complexa! Agora se a vida de la respira amonia, metano, alcool ou seja lá o que for é irrelevante. O que importa é se o carbono possui as condições mínimas para que ele consiga formar cadeias longas com proprosito de vida complexa!

  2. Realmente, é muito interessante!
    Especialmente considerando que existem Anãs Vermelhas aos montes – são as estrelas mais comuns no Universo.

    Gostei também da ligação aos planetas “rogue”, “free-floating”, ou seja, que não orbitam qualquer estrela.

    http://www.spacedaily.com/reports/Titan_Like_Exoplanets_999.html
    “If Titan was a rogue planet with no star to call home, the researchers wondered if it could still be covered in seas due to geothermal heat. The researchers calculate Titan would need to release about 20 times more geothermal heat than Earth does to keep its current surface temperature, which is unrealistic for a world its size. However, if its atmosphere was 20 times thicker than current levels, it could retain enough heat to still have surface oceans.”

    Finalmente, as possibilidades científicas aproximam-se da imaginação que muitos já têm sobre as diferentes possibilidades de líquidos e quiçá vida pelo Universo.

    Claro que para já, não passam de especulações… e podem ser somente “wishful thinking” que na verdade não serão exequíveis.
    Mas que estas ideias são estimulantes, disso não há dúvidas 🙂

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