KROTITE: um grão da poeira primordial!

Crónica publicada no “O Despertar“, semanário conimbricense.

Nesta altura de peregrinação, contemplo a inimaginável extensão, no tempo e no espaço, da Via Láctea.

Recordo que, segundo o Códice Calixtino, a direcção da Via Láctea era orientação preciosa de peregrinação, por ser o espelho celeste da Estrada ou Caminho de São Tiago. Curiosamente também o parece ser para Fátima!

Mas o que é a Via Láctea? É a galáxia em espiral a que pertence o nosso sistema solar.
E o Sol é apenas uma das duzentas a quatrocentas mil milhões de outras estrelas que, observadas a partir da nossa posição num dos braços em espiral (Braço de Orion) da galáxia, parecem estender-se numa mesma direcção, para cada um dos lados a partir do centro da Via Láctea.

A Via Láctea tem uma idade estimada entre 13 e 14 mil milhões de anos! Esta vetusta idade é inferida a partir da abundância em elementos pesados detectados em vários “pontos” da galáxia. Quanto maior a abundância nestes, maior a idade, sendo isto uma consequência da evolução estrelar. E os elementos pesados como é que são detectados? Através da observação dos seus espectros de emissão e absorção electromagnéticos, que são uma espécie de BI da sua identidade atómica. Mais especificamente, a identificação das linhas de absorção num diagrama de Fraunhofer obtido para um dado corpo celeste que emita radiação electromagnética, permite determinar a sua composição elementar.

O sistema solar a que pertencemos é significativamente mais jovem: cerca de 4,568 mil milhões de anos! A determinação desta idade segue uma aproximação metodológica diferente. A idade do nosso sistema solar é definida a partir do momento da formação dos primeiros grãos sólidos no disco nebular ou nebulosa que rodeava o proto-sol. Há evidências de que estes primeiros grãos tenham sido constituídos por associações de vários elementos em torno de núcleos minerais de cálcio (Ca) e alumínio (Al). Através da datação radiométrica (medição da radiação relativa emitida por determinados elementos radioactivos) de inclusões em determinados meteoritos de minerais ricos em Ca-Al, os cientistas estimam há quanto tempo foi o nosso primeiro segundo.

A idade atrás referida foi publicada em 2010 num artigo da Nature Geoscience e obtida a partir de um estudo radiométrico da proporção relativa dos isótopos 207 e 206 de chumbo (Pb) presentes em inclusões ricas em Ca-Al num meteorito condrítico carbonáceo encontrado no Noroeste de África e designado por NWA 2364 CV3.

A análise estrutural das inclusões minerais neste tipo de meteoritos encontrados nessa região Africana permitiu que um outro grupo de cientistas descobrisse, no meteorito NWA 1934 CV, um mineral até agora desconhecido e que foi baptizado originalmente por “Krotite”.

O estudo da “Krotite”, cuja fórmula química é CaAl2O4, foi agora publicado na revista American Mineralogist, e revela uma rara mistura de cálcio e alumínio refractária, o que significa que a sua estrutura é estável a temperaturas elevadas. Isto e a baixa densidade da inclusão, com a forma de ovo partido, onde foi encontrado, são compatíveis com a hipótese de ter sido um dos primeiros grãos formados aquando da origem do nosso sistema solar.

É o sussurro mineral mais antigo das nossas origens.

António Piedade

1 comentário

  1. Parabéns pela divulgação!

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