O ar que os dinossauros respiravam

Galopim de Carvalho escreveu este delicioso texto sobre o que respiramos do tempo dos dinossauros.
Retiro estes excertos:

“Há 170 milhões de anos, no Jurássico médio, a região da Serra d’Aire, onde hoje se situa a importante (e em lamentável degradação) jazida com pegadas de dinossáurios da Pedreira do Galinha, era mar. Um mar recifal, azul celeste, muito pouco profundo (escassos metros), de águas mornas e transparentes, como o das Caraíbas, repleto de vida e cor, onde as praias alvejavam de areia fina e branca como a neve.

(…)

No mar, os moluscos, os corais, as algas e muitos outros organismos absorviam o dióxido de carbono do ar e o cálcio dissolvidos na água, para, com eles, edificarem as suas conchas e carapaças de natureza calcária.

Após a morte destes construtores de carbonato de cálcio, estas partes esqueléticas eram trituradas pela agitação das águas e pela predação levada a efeito por alguns animais, transformando-se em areias e em lamas muito finas.

Ao acumular-se e endurecer, estes sedimentos deram origem às camadas de calcário (como as que se podem ver na auto-estrada A1, na travessia da Serra d’Aire) que guarda, na sua composição, o dióxido de carbono do ar desse tempo. Se, na laje que conserva as pegadas, na referida jazida, atacarmos o calcário com um ácido, produz-se um borbulhar que não é mais do que a libertação desse gás nele aprisionado e, assim, ao inalá-lo, estamos a respirar parte do ar que os grandes saurópodes aqui respiraram há 170 milhões de anos.

(…)

Por exemplo, um lisboeta, morador na Rua Sampaio Bruno, onde aflora o que resta da paisagem natural desta zona da cidade, pode libertar o dióxido de carbono aprisionado no carbonato de cálcio dos fósseis de briozoários conservados naquele fundo marinho recifal de há cerca de 23 milhões de anos, mas se proceder, de modo idêntico, no Vale de Alcântara, liberta um gás mais antigo, com cerca de 95 milhões. Em Peniche ou em Coimbra, nos calcários do Liásico (Jurássico inferior), ainda a título de exemplo, podemos recuar aos 200 milhões de anos.”

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  1. […] – Extinções. Dinossauros (ar que respiravam, matéria negra). Humanidade. Clovis. Mamutes. Tunguska. […]

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