Crânios de humanos primitivos imprimem inteligência primitiva em alguns humanos modernos

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Um estudo de cinco crânios com 1,8 milhões de anos levou a que uma equipa de investigadores proponha a hipótese que os diversos tipos de homens primitivos, como Homo habilis, Homo erectus, etc, em vez de serem espécies diferentes, seriam realmente uma única espécie com algumas variações entre eles.

Esta é uma notícia “bombástica”, mas relativamente “normal”, em que tudo fica mais ou menos na mesma sobre o que sabemos.
Afinal, é só uma hipótese e tem a ver simplesmente com classificações que fazemos. Nada mais.

Para tentar simplificar as coisas, deixem-me comparar com algo mais do dia-a-dia.
Nós classificamos as pessoas em termos de países. Por exemplo, existem os Argentinos, os Mexicanos, os Chilenos, etc. Depois de sabermos isto durante muitos anos, surgiu a hipótese de que afinal eles não são assim tão diferentes: na verdade, falam a mesma língua e são originários da mesma zona (Espanha) pertencendo assim ao grupo de Latinos.
Ou seja, nenhum do conhecimento que tínhamos anteriormente se modificou, nenhuma das características individuais de cada grupo se modificou, simplesmente acumulamos mais algum conhecimento de modo a gerar uma hipótese que possa classificar melhor os diferentes grupos num só.

Foi mais ou menos isto que aconteceu agora com a nova hipótese surgida para classificar populações primitivas de humanos.
Nenhum das características desses grupos foi colocada em causa, mas simplesmente sugeriu-se a hipótese de que na verdade esses grupos não são assim tão diferentes (diferentes espécies) mas podem talvez ser classificados dentro duma só espécie mesmo que tenham algumas características diferentes entre si. Isto não tem nada de extraordinário: pelo contrário, tendo em conta a diversidade de espécies classificadas pela história com base em evidência fóssil será “normal” que alguns fósseis tenham dado a ideia que se estava na presença de algo diferente quando na verdade seria algo já classificado anteriormente mas com algumas características diferentes.
Realço que mesmo isto é só uma hipótese. Vários investigadores olharam para as mesmas evidências e tiraram outras conclusões, como por exemplo ter-se descoberto uma espécie nova. Por isso, é preciso estudar muito melhor os achados.

No entanto, pelo Google e pelo Facebook, leram-se frases sensacionalistas e erradas como “Teoria da Evolução derrubada”, “Evolução colocada em causa” ou “É necessário re-escrever a história humana”.
Se lerem estas expressões em alguns websites (incluindo alguns jornais!), sabem que estão na presença de sensacionalistas.

A verdade é que a nova hipótese realça o acumular de conhecimento, reforça a excelência do método científico e permite ter mais evidências da veracidade da Teoria da Evolução.

Felizmente existem alguns jornais que fizeram um excelente trabalho a comunicar este estudo.

Por exemplo, leiam este artigo da Ana Gerschenfeld no jornal Público:

“Análise de cinco crânios com 1,8 milhões de anos encontrados no Cáucaso sugere que os primeiros homens primitivos que saíram de África pertenciam todos a uma única espécie. Ideia ainda controversa.
(…)
E se em vez de serem todos de espécies diferentes, os diversos homens primitivos cujos fósseis têm sido encontrados ao longo dos anos em diversos locais — Homo habilis, Homo rudolfensins, Homo erectus e outros — fossem todos membros de uma única e mesma espécie de humanos e as suas diferenças físicas apenas reflectissem a normal variabilidade entre indivíduos dessa espécie? Os autores de um novo estudo comparativo de crânios fósseis humanos encontrados no Cáucaso, e publicado esta sexta-feira na revista Science, afirmam que é precisamente isso que os seus resultados sugerem.
(…)
A peça-chave do trabalho desenvolvido nos últimos oito anos por David Lordkipanidze, director do Museu Nacional da Geórgia, e uma equipa internacional de colegas, é um crânio — designado Crânio 5 — com quase 1,8 milhões de anos. O seu maxilar inferior foi encontrado em 2000 na escavação arqueológica de Dmanisi (a uns 100 quilómetros de Tbilisi, a capital da Geórgia) — e o resto do seu rosto e cabeça em 2005.
(…)
Acontece que o Crânio 5 não era de todo o que os cientistas esperavam, visto o carácter maciço do maxilar previamente desenterrado. Estavam à espera de um crânio de grande tamanho, mas depararam-se, pelo contrário, com uma caixa craniana pequena por cima de um grande rosto, numa combinação de traços morfológicos nunca antes observada num homem primitivo.
(…)
Também em Dmanisi foram encontrados, ao longo dos anos, mais quatro crânios (apenas um sem maxilar inferior), algumas ferramentas de pedra e ossos fossilizados de animais — achados que, segundo estudos anteriores, são vestígios deixados por um grupo de humanos que viveu no mesmo sítio ao mesmo tempo. “O tempo que demorou a formação geológica do local foi bastante breve, o que permite concluir que a sedimentação de todos os ossos [de homens primitivos] aconteceu em simultâneo”, explicou Lordkipanidze. “Dmanisi é como uma cápsula do tempo que preservou um ecossistema de há 1,8 milhões de anos.”
(…)
Os crânios de Dmanisi permitem realizar análises comparativas que até aqui não eram possíveis. E de facto, perante a descoberta do resto do Crânio 5 e da sua inédita anatomia, tornou-se necessário explicar as diferenças físicas patentes entre os cinco crânios humanos daquele sítio paleontológico, que fazem com que alguns deles sejam mais bem classificados como Homo habilis e outros como Homo erectus. Poderiam estes homens primitivos, que ao que tudo indica faziam parte da mesma comunidade, ter pertencido a várias espécies diferentes de humanos? “Sabíamos que vieram do mesmo local e do mesmo período geológico; podiam portanto representar uma única população de uma única espécie”, salientou Christoph Zollikofer, um outro co-autor, também da Universidade de Zurique.
(…)
“Embora os cinco indivíduos de Dmanisi sejam claramente diferentes uns dos outros, não são mais diferentes entre eles do que cinco humanos modernos ou cinco chimpanzés numa dada população.” Ou seja, “a diversidade no interior de uma espécie é a regra e não a excepção”. (…)”

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Leiam também este artigo no jornal Terra:

“Segundo a hipótese, as diferentes linhagens que alguns especialistas descreveram na África – como o Homo habilis e o Homo rudolfensis – foram apenas povos antigos da espécie Homo erectus.
(…)
Um crânio assombrosamente bem preservado de 1,8 milhão de anos atrás oferece novas evidências de que o homem primitivo pertenceu a uma única espécie com um leque amplo de aparências diferentes, afirmaram cientistas em um estudo publicado esta quinta-feira na revista Science.
(…)
Com um cérebro minúsculo, com um terço do tamanho do humano moderno, fronte projetada e mandíbulas salientes como um símio, o crânio foi descoberto nos restos de uma cidade medieval nas montanhas de Dmanisi, Geórgia, destacaram. Trata-se de um dos cinco crânios de homens primitivos – quatro dos quais com mandíbulas – encontrados no sítio, localizado a cerca de 100 km da capital, Tbilisi, juntamente com ferramentas de pedra que sugerem o abate de animais, e os ossos de grandes felinos com dentes de sabre.​
(…)
Os cientistas compararam a variação em características dos crânios e descobriram que, embora suas mandíbula, fronte e formas do crânio fossem diferentes, seus traços pertenciam todos ao espectro do que se poderia esperar entre membros da mesma espécie.
(…)
Segundo esta hipótese, as diferentes linhagens que alguns especialistas descreveram na África – como o Homo habilis e o Homo rudolfensis – foram apenas povos antigos da espécie Homo erectus, com aparências diferentes entre si. Isto também sugere que os membros primitivos do gênero Homo, ao qual pertence o homem moderno, primeiro surgiram na África e logo se expandiram para a Ásia, apesar de seu cérebro de tamanho pequeno.
(…)
Mas nem todos os especialistas concordam. “Penso que as conclusões a que chegaram estão mal orientadas”, afirmou Bernard Wood, diretor do programa de doutorado em paleobiologia de hominídeos da Universidade George Washington.
(…)
“O que temos é uma criatura da qual não tínhamos visto evidências antes”, acrescentou, destacando a cabeça pequena no corpo com o tamanho de um ser humano. “Poderia ser algo novo e não entendo porque estão relutantes em pensar que deve ser algo novo”, prosseguiu.
De fato, os cientistas batizaram a descoberta de Homo erectus ergaster georgicus, em um sinal de que o crânio é uma forma primitiva, porém recente de Homo erectus encontrado na Geórgia. O nome também destaca o status de espécie única do Homo georgicus, em vista da mandíbula que foi encontrada no ano 2000 juntamente com outros crânios pequenos e primitivos. (…)”

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Podem ler o artigo científico, aqui.

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