O Equinócio da Primavera e o mito do dia igual à noite

De acordo com o site do Observatório Astronómico de Lisboa, o Equinócio da  Primavera ocorre hoje, dia 20 de Março às 16h57. Assim começa hoje a primavera no Hemisfério Norte e o outono no Hemisfério Sul.

Nos Equinócios o eixo de rotação da Terra é perpendicular à linha imaginária que une a Terra ao Sol: a luz solar é rasante em ambos os pólos. A duração do dia é aproximadamente a mesma em todos os locais do planeta.
Nos restantes dias, um dos pólos está mais ou menos inclinado em direção ao Sol, sendo a duração do dia e da noite variável e dependente da latitude do observador.

Nesse mesmo site, podemos ler a definição de Equinócio «Equinócio: instante em que o Sol, no seu movimento anual aparente, corta o equador celeste. A palavra de origem latina significa “noite igual ao dia”, pois nestas datas dia e noite têm igual duração».

Nada de novo; qualquer livro, revista ou manual escolar nos dirá que, por definição, nos equinócios o dia e a noite têm a mesma duração: 12 horas.

Quando se procura saber a que horas é que o Sol hoje nasceu e a que horas será o ocaso,  o mesmo Observatório também informa que, por exemplo, em Lisboa o Sol nasceu às 06h41 e irá pôr-se às 18h49. Ou seja o dia terá 12 horas e 8 minutos e não as 12 horas certas que teria de acordo com a definição de equinócio.

Será que o Observatório se enganou nas horas do nascimento e do ocaso do Sol? Ou será que o Equinócio já ocorreu num outro dia em que de facto o dia e a noite tiveram igual duração?

Nem uma coisa nem a outra. Apesar de parecerem incompatíveis, ambas as informações estão… aproximadamente corretas.

 

Mas então o dia e a noite não têm ambos a mesma duração?

Teriam, se a Terra não tivesse atmosfera e se o Sol fosse uma fonte de luz pontual.
Como a Terra tem à sua volta uma atmosfera, a luz do Sol que chega até nós tem que a atravessar. Essa camada gasosa, à semelhança de uma lente, refracta (desvia) ligeiramente a luz que a atravessa. Essa refração ou desvio é mais intensa junto ao horizonte pois a luz rasante terá que passar por uma camada muito mais espessa de ar. Apesar de variar com a pressão atmosférica e com a temperatura, normalmente a refração junto ao horizonte é suficiente para nos deixar ver o Sol quando ele ainda está (ou já está) efectivamente abaixo do horizonte, acrescentando assim alguns minutos ao dia.

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Também a forma e tamanho aparentes do Sol influenciam a duração do dia. Estabeleceu-se que o Sol nasce quando o bordo superior surge acima do horizonte e o ocaso ocorre quando o bordo superior desaparece abaixo do horizonte. Também aqui se “ganham” alguns minutos.
Apesar de ser o bordo superior que marca a hora do nascimento e do ocaso do Sol, é a trajectória aparente do centro do disco solar ao longo da eclíptica que estabelece o momento em que ocorrem os Equinócios.

É o aparecimento ou desaparecimento do bordo superior do Sol, num horizonte teórico ao nível do mar, que determina a hora do nascimento ou ocaso do Sol.

Assim, se atendêssemos apenas às posições relativas do Sol e da Terra, a duração do dia seria hoje exactamente igual à duração da noite, para qualquer lugar à superfície da Terra. Na realidade, as coisas não se passam bem assim e o dia tem sempre vários minutos “a mais”.

Aproveitem bem esses minutos a mais…

23 comentários

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  1. Ontem o Equinócio teve início às 22:03h da noite. Fiquei na dúvida como seria a “conta” do dia igual a da noite. No caso, seria o dia 22 que teve o dia e a noite iguais? Ou “dividiria” e somaria o horário da noite do dia 22 com a do dia 23, com a manhã do dia 23 ? Achei confuso ter um horário específico para Equinócio, tendo em vista essa questão de ser igual 12/12h. Obrigada.

    1. Oi,

      Onde mora? Qual cidade?

      Pode ver o comprimento do dia (o tempo que o Sol fica no céu), na sua cidade, por exemplo aqui:
      https://www.sunrise-and-sunset.com/pt/sun/brasil/brasilia

      Tenha atenção os minutos a mais do que seria normal, caso a Terra não tivesse atmosfera, como explica o texto 😉

      abraço

  2. Errata: quando referi “Carlos Oliveira” deveria ter mencionado “Rui Costa”. As minhas desculpas.
    Os meus comentários corroboram o que o Daniel Folha expressou muito bem.
    Obrigado a todos. Rui Agostinho

  3. A) “Mas então o dia e a noite não têm ambos a mesma duração?
    Teriam, se a Terra não tivesse atmosfera e se o Sol fosse uma fonte de luz pontual.”

    Acontece que nem nesta situação a duração do dia seria igual à da noite.
    O Carlos Oliveira está a desconsiderar que a Terra se move no espaço durante estas 24 horas e, por isso, as duas durações seriam mesmo Diferentes.

    Deste modo, a frase “Assim, se atendêssemos apenas às posições relativas do Sol e da Terra, a duração do dia seria hoje exactamente igual à duração da noite, para qualquer lugar à superfície da Terra”
    também está incorreta… por alguns minutos de tempo, e esta razão não é a que alega.

    B) “Será que o Observatório se enganou nas horas do nascimento e do ocaso do Sol? Ou será que o Equinócio já ocorreu num outro dia em que de facto o dia e a noite tiveram igual duração?
    Nem uma coisa nem a outra. Apesar de parecerem incompatíveis, ambas as informações estão… aproximadamente corretas.”

    Não são “…aproximadamente…”, as duas afirmações estão Perfeitamente corretas!

    Tal como explicado do sítio do OAL, utilizam-se as coordenadas celestes do ponto central do sol para definir exatamente o instante (data) do equinócio (e do solstício).

    A definição de “dia de equinócio” como o dia com durações iguais nos períodos iluminado e escuro, é clássica e histórica e deve ser mantida assim, pois também representa a mudança da estação do ano, nas zonas temperadas. Além disso, ninguém quer decorar que o dia em que a duração do dia = à da noite ocorre n dias antes ou depois destes.

    O nascimento do sol é feito com o bordo superior do disco solar, acrescido do movimento diurno do sol ao longo da eclíptica nessas 24h, da latitude do lugar e da distância ao sol nesse dia que impõem o tempo que o disco demora a passar no horizonte, para além da refração atmosférica, o único fator que se refere neste artigo.

    Muitos cumprimentos. Rui J. Agostinho

  4. Sempre pensei que era considerado dia quando metade do disco solar surgisse no horizonte, e considerado noite quando metade do dico solar se “escondesse” no horizonte.

  5. Entretanto, o Observatório Astronómico de Lisboa está de parabéns. Desde o Equinócio da Primavera para o de Outono, atualizou a informação relativa à duração do dia e da noite.

    Em Março, definia Equinócio como “instante em que o Sol, no seu movimento anual aparente, corta o equador celeste. A palavra de origem latina significa “noite igual ao dia”, pois nestas datas dia e noite têm igual duração.” (http://oal.ul.pt/equinocio-da-primavera-2014/)

    Agora, No Equinócio de Outono consta o seguinte: “Sobre a duração igual das noites no equinócio, na realidade, não é bem assim… Os equinócios estão definidos como o instante em que o ponto central do sol passa no equador e, por isso, o centro solar nasce no ponto cardeal Este e põe-se exactamente a Oeste, encontrando-se durante 12 horas acima do horizonte matemático em qualquer lugar da Terra nestes dias.

    Contudo este facto não resulta numa duração do dia solar de 12 horas, pois a luz directa no chão surge quando o bordo superior do sol nasce, tal como desaparece no ocaso, e o sol tem um diâmetro aparente de 32′ (minutos de arco). Além disso há refracção atmosférica: quando o bordo superior está no horizonte o centro do sol encontra-se ≈50′ abaixo do horizonte, mais do que o seu diâmetro.” (http://oal.ul.pt/equinocio-de-outono-2014/).

    1. Leram este teu artigo 😀

    • Francisco Manuel Calado Abrunhosa on 22/03/2014 at 11:22
    • Responder

    Post didádico, sim senhor! Mas tem um senão: na 1ª gravura, os equinócios da primavera e do outono, decerto por lapso, estão às avessas. 🙂

    1. Às avessas? Não, o nome das estações está em duas cores: vermelho para o Hemisfério Norte e azul para o Hemisfério Sul 😉

  6. Antes de mais, parabéns pelo artigo é bem esclarecedor relativamente ao papel da refração atmosférica na duração do dia e da noite.

    Gostaria contudo de chamar a atenção para o seguinte: se atendêssemos apenas às posições relativas do Sol e da Terra, e se o Sol fosse um objeto pontual, no dia do equinócio a duração do dia (Sol acima do horizonte) e da noite (Sol abaixo do horizonte) não seria igual para a larguíssima maioria de locais na Terra. Os instantes de tempo consecutivos em que o Sol tem altura zero (sistema horizontal local), e que definem a duração do dia e da noite num período de 24 horas, dependem da declinação do Sol e esta varia continuamente (ver, por exemplo, http://www.esrl.noaa.gov/gmd/grad/solcalc/solardec.gif). Na realidade, é nos dias dos equinócios que esta variação é mais acentuada!

    O instante de nascimento e ocaso de um astro pode ser calculado através da equação
    cos(H0) = – tan(latitude_de_lugar) x tan(declinação_do_astro), em que H0 é o ângulo horário do astro (sistema equatorial local) no nascimento e no ocaso (esta equação tem duas soluções, uma positiva e uma negativa, com a primeira a corresponder ao instante do ocaso e a segunda ao instante do nascimento). A ideia da duração do dia igual à duração da noite vem de colocar declinação zero naquela equação, de onde resulta cos(H0)=0 e daqui H0_nascimento = – 6 horas e H0_ocaso = + 6h, ou seja, duração do dia igual a 12h (para além da “constatação” empírica de “duração de dia igual a duração da noite”). Acontece que entre o instante do nascimento do Sol e o instante do ocaso do Sol ***a declinação varia***, de onde resulta que as soluções da equação acima não são, em geral, simétricas, pelo que as durações de dia e noite não são iguais. A diferença pode ser da ordem de alguns minutos, dependendo da latitude de lugar.

    Para locais no equador, dado que a latitude de lugar é zero temos da equação acima que cos(H0) é sempre zero, independentemente da declinação do Sol, pelo que a duração de dia e noite seria sempre igual.

    Para quem quiser refletir nesta questão utilizando uma abordagem mais da geometria descritiva, deve pensar que a duração de dia igual a duração de noite resulta de considerar que no seu movimento aparente diurno o Sol desloca-se num paralelo celeste, e que, em particular, nos dias de equinócio o Sol se desloca no equador celeste. O Sol só se deslocaria, no seu movimento aparente diurno num paralelo celeste, ou no equador celeste, se a sua declinação fosse constante durante um determinado período de tempo. As alturas do ano em que esta aproximação é mais razoável é nos solstícios, já que é naquelas alturas que a declinação do Sol varia mais lentamente (ver de novo a figura acima referenciada).

    Abraços.

    1. De acordo. O equinócio é só um instante: o momento em que o centro do Sol cruza o prolongamento da linha do equador. Apenas nesse instante é que a declinação do Sol é de 0º. No dia do equinócio de primavera, o Sol nasceu ainda no inverno (Hem. N.), com uma declinação negativa de alguns minutos de arco e o ocaso ocorreu já na primavera com uma declinação positiva de alguns minutos de arco.

      Mas espero que concorde que esses pormenores são supérfluos neste tipo de artigo genérico. Se quisesse ser rigoroso, também teria que tomar em consideração a altitude do lugar em que o observador se situa, bem como variações locais porque a Terra não tem uma forma regular, daí dizer-se que a forma da Terra é um geóide.

      Mas obrigado por ler o artigo com atenção. Mostra que vale a pena escrever 🙂

        • Daniel Folha on 23/03/2014 at 05:31

        Discordo com a classificação de “supérfluo”. Dependendo do instante em que ocorre o equinócio e da latitude do local, a contribuição da variação da declinação para a diferença entre a duração do dia e da noite (em dia de equinócio) pode ser da ordem de alguns minutos, ou seja da mesma ordem de grandeza daquela que é produzida, em muitos locais da Terra, pela refração e pelo facto do Sol não ser um objeto pontual.

        Concordo que o “pormenor” da contribuição devida à variação da declinação não teria que fazer parte do artigo. Aliás, nem teria escrito o comentário que escrevi, não fosse a afirmação “Assim, se atendêssemos apenas às posições relativas do Sol e da Terra, a duração do dia seria hoje exactamente igual à duração da noite, para qualquer lugar à superfície da Terra”, que apresenta quase no final do artigo, e nela não posso deixar de reparar no “exactamente”. Aquela afirmação é falsa e por isso induz o leitor em erro. E é falsa, em primeira ordem, devido à constante variação da declinação do Sol.

        Claro que vale a pena escrever sobre estes assuntos. Vale sempre a pena ajudar os outros a compreender melhor o universo que nos rodeia. O artigo “O Equinócio da Primavera e o mito do dia igual à noite” faz precisamente isso. E o objetivo do meu comentário foi **exatamente** o mesmo.

        Continuação do bom trabalho. 🙂

        • Daniel Folha on 23/03/2014 at 13:25

        No meu comentário, onde se lê “constante variação” deveria ler-se “continua variação”.

    • Antonio de A, Sabtis on 22/03/2014 at 03:07
    • Responder

    O dia nasce ao primeiro raio de sol e termina ao último. Pohipótese o dia começa às 6 horas. 12 horas depois osol inicia o ocaso e leva, ainda po hipótese, 2 minutos para desaparecer. O dia teve 12 horas e 2 minutos e a noite 11 horas e 58 minutos. A não ser que se considere o inícui e o fim do dia quando o sol estiver meio nascendo e meio se pondo. Como mero curioso, perunto: CERTI ou ERRADO.

    o………………………………………………………………….0
    |= 6horas……………………………………………………|=18 horas.
    | início do dia …………………………………………… | fim do dia

    1. Certíssimo. Essa é uma das razões que levam a que o dia seja maior: considera-se que o Sol nasce assim que o bordo superior do disco solar surge acima do horizonte e que o Sol se põe quando todo o Sol fica abaixo do horizonte.
      O tempo que o disco solar leva a cruzar o horizonte é contabilizado para a duração do dia 😉

  7. Victor, sua dúvida tem fundamento, e o artigo do amigo também tem. Mas o que ocorre é o seguinte, quando falamos que durante os equinócios o dia e a noite tem a mesma duração estamos efetuando tal afirmação considerando apenas a posição relativa entre a Terra e o Sol, isto é, não estamos considerando as demais variáveis, como o efeito da refração. Há um cálculo no qual podemos inferir as durações do dia e da noite, no qual utilizamos a latitude local e a data em questão (e o mesmo desconsidera os efeitos da refração); o livro é de autoria do professor Roberto Boczco e é intitulado Conceitos de Astronomia. É importante salientar que para referência sobre a linha do equador o dia e a noite terão 12 h cada durante o ano todo, claro que considerando apenas os efeitos das posições relativas entre a Terra e o Sol. Abraços.

    1. José Nilson, obrigado por responder ao Victor 🙂

      De facto, é como diz. Qualquer localidade situada sobre a linha do equador e ao nível do mar terá dias e noites com a mesma duração durante todo o ano. E, como explicado no artigo, o dia terá sempre mais alguns minutos que a noite.

    • Victor Monteiro on 21/03/2014 at 15:59
    • Responder

    Bom dia, meu nome é Victor eu moro no Brasil no estado do Amapá na cidade de macapá uma cidade que é “cortada” pela linha do equador gostaria de saber se essa sua afirmação de que o dia não tem a mesma duração que a noite é valida para ca ou apenas ai em portugal? por aqui sempre disseram que dia e noite tinha a mesma duração mas lendo esse artigo me deixou com duvidas, aqui conseguimos exatamente ficar em latitude ’00 , aguardo respostas

    att Victor Monteiro

  8. Belissima forma de divulgar ciência. Parabéns.

    • Jorge Almeida on 20/03/2014 at 23:15
    • Responder

    A Primavera já começou há mÊs e meio.

    1. Há mês e meio?

    • Manel Rosa Martins on 20/03/2014 at 19:16
    • Responder

    Que belo post Rui, parabéns. 🙂

    Boa Primavera para todos!

    1. Obrigado 🙂

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