Lâmpadas

Neste artigo vou falar-vos de uma tecnologia relativamente simples, mas que revolucionou o mundo, a lâmpada. Não irei discorrer muito sobre a parte histórica, pois essa facilmente a podem aprender ou relembrar na wikipedia, por exemplo.

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Existem vários tipos de lâmpadas, mas neste artigo irei apenas referir três, que do meu ponto de vista são os mais importantes (sendo que a maioria dos outros são semelhantes a estes): lâmpadas incandescentes, lâmpadas fluorescentes e LEDs. Aviso desde já que a dificuldade de compreensão deste artigo irá crescendo à medida que o vão lendo, pois alguns tópicos mereciam um detalhe muito maior àquele que aqui transmito (alguns irão eventualmente vir a ser melhor explicados em artigos futuros).

Lâmpada de incandescência

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A lâmpada de incandescência foi inventada por Humphry Davy, em 1802 e não por Thomas Edison. Thomas Edison criou sim a primeira lâmpada comercializável (o que não deixa de ser muito importante, é claro).

Esta lâmpada faz uso da Lei de Joule, lei que nos diz que uma corrente eléctrica ao passar numa resistência gera calor – a mesma lei que é usada para criar aquecedores que usem resistência. A diferença entre os aquecedores e a lâmpada é que a lâmpada usa um material que fica tão quente que começa a emitir luz. Aliás, na verdade alguns destes aquecedores também emitem luz, não luz branca, mas luz vermelha, o que está simplesmente relacionado com o calor gerado (como discutido no artigo do Fogo), que é inferior ao das lâmpadas (pois a luz branca é mais “quente” que a luz vermelha).

O leitor poderá estar a questionar-se sobre o porquê de uma corrente eléctrica produzir calor. Para compreender isso, convém saber o que é “corrente eléctrica”. Relembro que a matéria é constituída por muito pequenas partículas chamadas átomos e que estas possuem electrões (os quais possuem carga eléctrica). O movimento ordenado de electrões chama-se corrente eléctrica. Este movimento, porém, não se dá em geral sem uma oposição (excepto em supercondutores) – a essa oposição dá-se o nome de resistência (eléctrica). Esta resistência consiste basicamente em “obstáculos” que os electrões encontram no seu movimento, como se fossem colidindo com outras partículas (com carga) pelo caminho. Estas “colisões” geram calor. Podem associar, por exemplo, à entrada de um meteoro na atmosfera – como sabem, ele fica a “arder” devido às colisões que sofre com as partículas de ar. O mesmo se passa nas lâmpadas de filamento de incandescência: o filamento fica incandescente devido às colisões que a corrente eléctrica sofre ao passar pelo filamento (que possui uma dada resistência eléctrica). Estas lâmpadas têm fraca eficiência exactamente devido ao calor que libertam, pois apenas uma pequena parte da energia eléctrica que recebem é transformada em energia luminosa. Apenas 5% da energia é transformada em luz visível! Daí que a União Europeia tenha abolido o uso deste tipo de lâmpadas.

Lâmpada fluorescente

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Esta lâmpada foi criada por Nikola Tesla em 1938, usando os conhecimentos obtidos por vários cientistas antes dele, como Stokes, Geissler, Crookes, entre outros.

O princípio de funcionamento desta lâmpada é bem mais complexo que o da lâmpada de incandescência. Antes de mais convém relembrar mais alguns pormenores sobre os átomos (poderão também ler o artigo O Mundo das Partículas I para mais detalhes). Como disse em cima, os átomos são constituídos por electrões (bem como protões e neutrões no seu núcleo). Os electrões encontram-se dispostos por níveis de energia, os quais dependem da distância ao núcleo. Níveis mais distantes do núcleo são mais energéticos, mas menos estáveis, pelo que se houver níveis mais estáveis livres, electrões de níveis mais energéticos irão transitar para os mais estáveis, libertando fotões (luz) de energia igual à diferença de energia dos níveis em causa na transição.

O funcionamento divide-se então em três partes: primeiro faz-se colidir electrões (da corrente eléctrica) com partículas de mercúrio (presente no estado de vapor dentro do tubo). Este processo transmite energia aos átomos de mercúrio que ficam assim “excitados” (o que significa que coloca electrões em níveis energéticos mais altos que o normal, em que o normal é ter os estados de energia mais baixa, mais estáveis, todos ocupados). Como estes estados electrónicos são instáveis, os electrões “caem” para níveis de energia mais baixos, havendo assim emissão de luz. Esta luz, porém, é demasiado energética para ser vista – é ultravioleta. É por isso necessário usar um outro material para “transformar” esta luz ultravioleta (UV) em luz visível (de menor energia). Este processo de “transformação” chama-se fluorescência e faz uso do revestimento da lâmpada que é uma substância que ao receber a luz UV, sofre também ela uma excitação nos seus electrões; consequentemente, os electrões relaxam para os níveis mais estáveis, libertando luz visível (a diferença de energia entre a luz UV e a visível é responsável pelo aquecimento do revestimento da lâmpada). Finalmente, esta luz permite que o cátodo (um dos terminais eléctricos da lâmpada) fique suficientemente quente para que haja um outro processo chamado de emissão termiónica. Neste processo, também conhecido como efeito Edison (que o descobriu acidentalmente), os electrões de um metal ganham energia suficiente para lhe escapar. Estes electrões são então “puxados” para o ânodo (o outro terminal da lâmpada), passando por dentro do tubo. Neste tubo, além do gás de mercúrio, existe ainda um gás nobre* (normalmente Árgon). Os electrões ao passarem pelo gás “colidem” com ele e fazem com que este se ionize, o que significa que este gás perde electrões. Estes novos electrões soltos juntam-se aos outros, criando um processo em cadeia que ioniza todo o gás nobre no interior do tubo. Os iões, como possuem carga, permitem que a corrente flua com menor resistência, permitindo um aumento de corrente eléctrica dentro do tubo. Este processo de ionização não produz luz, tem apenas a função de aumentar a corrente dentro do tubo, porque isso aumenta a probabilidade de haver colisões entre electrões e átomos do gás de mercúrio, o qual conduz à fluorescência, como antes expliquei, fazendo portanto com que a lâmpada funcione com maior eficiência.

*Um gás nobre é um gás que não reage com outras substâncias, porque os seus níveis electrónicos são de certo modo mais estáveis que os de outras substâncias.

LED

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A sigla significa light-emitting diode, o que traduzido para português é díodo emissor de luz. Um díodo é também chamado de junção P-N, porque trata-se da junção de dois materiais semicondutores, um de tipo p, outro de tipo n. Um semicondutor, como o nome indica, é um material que tem uma condutividade eléctrica (que é o inverso da resistência eléctrica) intermédia – entre um isolador e um condutor. Um isolador é um material cuja resistência eléctrica é tão alta que normalmente não permite a passagem de corrente (por exemplo a borracha), enquanto um condutor é um material com baixa resistência eléctrica (e portanto alta condutividade) e que por isso permite a passagem de corrente (por exemplo o cobre, que é usado nos fios condutores da electricidade das vossas casas). Não querendo entrar em demasiados pormenores, um semicondutor de tipo p é um semicondutor ao qual foi misturada uma substância (“dopagem”) que alterou as suas propriedades eléctricas de tal forma que este ficou com transportadores de carga livre chamados de “lacuna”, que são basicamente a ausência de electrões (o que é equivalente a dizer que a lacuna tem carga positiva, visto que o electrão tem carga negativa). Nos semicondutores de tipo n tem-se o oposto, ou seja, a dopagem faz com que o material fique com electrões livres. Assim, se juntarmos estes dois materiais, sendo um aceitador de electrões, e o outro dador de electrões, haverá necessariamente uma zona de contacto onde se cria um isolador, devido à recombinação de electrões livres com lacunas, isto porque sem electrões ou lacunas, não há transportadores de carga e sem estes, não passa corrente eléctrica. O interesse desta junção é que se se fizer passar uma corrente eléctrica pela junção, esta só consegue passar num sentido – aquele que faz diminuir a área de recombinação, ou seja, a área onde se cria um isolador. Que sentido é esse? Trata-se de ligar o pólo negativo ao semicondutor do tipo n, porque isso faz repelir os electrões livres em direcção à área de contacto, e o pólo positivo ao do tipo p, para “empurrar” as lacunas positivas também para a área de contacto – assim a área de recombinação é diminuída e se a tensão eléctrica aplicada for suficientemente elevada para fazer a corrente passar a zona isolante, então haverá efectivamente condução eléctrica – diz-se que o díodo está polarizado directamente. (Como poderão imaginar, se ligarmos os terminais ao contrário, haverá também uma tensão eléctrica capaz de fazer passar corrente, simplesmente terá que ser muito maior que no caso antes referido, visto que a área isolante é muito maior. Maior tensão irá fazer com que haja maior calor gerado, o que acaba por estragar a junção, a menos que esta tenha uma forma de dissipar essa energia, que é o caso do chamado díodo de Zener, que foi especialmente desenhado para funcionar com polarização inversa.) Os díodos são muito importantes em electrónica, porque permitem, como vêem, controlar o sentido da corrente – esta só passa se vier num sentido, dentro de uma dada banda de tensões eléctricas de funcionamento. (Poderão recordar alguns detalhes sobre tensões eléctricas no artigo de como fazer uma pilha.)

Num LED ocorre electroluminescência: ao ser aplicada uma corrente directa a este tipo de díodo, as recombinações de electrões com as lacunas fazem com que haja emissão de luz (a cor da luz varia com os materiais usados). Notar que esta recombinação não é mais que a captura de um electrão para os níveis de energia livres do semicondutor (da sua lacuna), semelhante aos processos antes explicados para gases, nas lâmpadas fluorescentes. No presente, os LEDs ainda são um pouco caros em relação às lâmpadas fluorescentes, mas num futuro próximo é provável que venham a ganhar a “corrida”, pois são mais eficientes, têm maior durabilidade, são mais robustos e permitem uma comutação mais rápida (ligar e desligar mais rápido).

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Antes de Edison. | Depois de Edison.

Havia muito mais para dizer, mas fico-me por aqui, para não tornar este artigo demasiado pesado. Se tiverem dúvidas poderão colocá-las em comentário. Alguns dos conceitos aqui referidos (e talvez não convenientemente explicados) serão detalhados em artigos posteriores.

5 comentários

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  1. A minha dúvida em relação às lâmpadas fluorescentes é a seguinte:
    Estas lâmpadas possuem diversas temperaturas de cores: 2700k (amarela); 4000k (branca neutra); 6400k (branca azulada). O que eu quero saber é o que ocorre ou o que contém dentro das lâmpadas que determinam a temperatura de cor de cada uma.

      • Marinho Lopes on 30/05/2014 at 20:14
      • Responder

      Como disse no artigo, a luz vem principalmente da fluorescência do revestimento da lâmpada, em que os electrões do material são excitados pela luz UV e depois emitem luz visível, ao voltarem ao estado não excitado. Diferentes materiais têm electrões com diferentes níveis de energia, o que significa que uma vez excitados por luz UV, voltam para um estado diferente de não excitação, caracterizado por uma energia diferente. Consequentemente, a luz emitida tem uma energia diferente e como tal também uma cor diferente. Em suma, basta alterar o material do revestimento da lâmpada.

      (Nos LEDs é semelhante: diferentes materiais têm diferentes níveis de energia, pelo que darão cores diferentes.)

      Cumprimentos,
      Marinho

    • José Simões on 29/05/2014 at 20:52
    • Responder

    O problema com as lâmpadas fluorescentes compactas é que não têm tamanhos padronizados.

    Quando uma se avaria tentamos arranjar uma mesma forma e tamanho potência e… não encontramos.

    Compramos uma parecida e depois pode não caber no local onde estava a anterior.

    As lojas não aceitam de volta (vêm sempre convenientemente fechadas em plástico que se tem de partir para abrir) e lá se fica com uma lâmpada que só vai servir para ocupar espaço com prejuízo para a bolsa, e o ambiente. E dar lucro a quem as fabrica.

    Não sou de teorias de conspiração, mas dá que pensar.

    1. Eu diria que o objectivo é facilitar, dando uma larga margem de opções aos consumidores, pelo que não acredito na teoria da conspiração (até porque nunca tive o problema que refere). Se for a uma loja com uma larga oferta de produtos do género, à partida poderá mostrar a lâmpada estragada para que lhe arranjem uma igual. E em muitas é também possível trocar… Creio portanto que o seu problema foi com os vendedores e não com os fabricantes.

      Cumprimentos,
      Marinho

        • José Simões on 02/06/2014 at 21:25

        Eu compro as minhas lâmpadas (e o resto) nessas grandes superfícies não se passa nada assim.

  1. […] resistência eléctrica (já falei de resistências eléctricas quando expliquei o funcionamento de lâmpadas de incandescência). Assim, é possível construir voltímetros a partir de amperímetros, usando uma resistência […]

  2. […] Em cima a representação de um díodo, a meio um exemplar real, e em baixo o sentido em que a corrente pode passar. Notar que um LED também é um díodo (ver mais em Lâmpadas). […]

  3. […] dissipação energética num fio de electricidade vem do efeito de Joule (explicado no artigo das Lâmpadas). O efeito de Joule é tanto maior quanto for a corrente eléctrica, no entanto, não varia com a […]

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