Um oceano em Caronte?

superficie_Plutao_ESORepresentação artística da superfície de Plutão. Suspensa no céu encontra-se Caronte, a maior lua de Plutão.
Crédito: ESO/L. Calçada.

Caronte, a maior lua de Plutão, poderá ter um oceano de água líquida no seu interior, sugere um estudo recentemente publicado na revista Icarus. Localizados a mais de 4,4 mil milhões de quilómetros de distância do Sol, os dois objetos formam um dos poucos sistemas binários do Sistema Solar. Caronte tem pouco mais de metade do diâmetro de Plutão e segue uma órbita a apenas 17,5 mil quilómetros de distância do centro de massa do sistema, um ponto exterior a Plutão. O interior de Caronte contém uma maior proporção de materiais voláteis que o interior de Plutão, o que sugere que o sistema teve origem num gigantesco impacto.

Atualmente, a órbita de Caronte é aproximadamente circular, mas no passado, terá sido significativamente elíptica, pelo que terá produzido tensões gravitacionais significativas no interior de Caronte geradas pela força de maré. Estas tensões poderão ter criado condições muito semelhantes às que hoje observamos em Encélado e Europa – dois mundos com crustas fraturadas e com evidências de oceanos no seu interior.

Europa_cor_natural_ISS_Voyager2_090779_BjornJonssonEuropa em cores naturais. Mosaico construído com imagens obtidas pela sonda Voyager 2 a 09 de Julho de 1979.
Crédito: NASA/JPL/Björn Jónsson.

Para testar esta hipótese, a equipa de investigadores liderada por Alyssa Rhoden criou uma série de modelos computacionais da evolução do sistema Plutão-Caronte. “O nosso modelo prevê diferentes padrões de fraturas dependendo da espessura do gelo superficial, da estrutura do interior da lua e da facilidade com que se deforma, e de como evoluiu a sua órbita”, afirmou Rhoden à NASA.

O trabalho mostra que se no início a órbita de Caronte tivesse apenas uma excentricidade mínima, a fricção gerada no seu interior pelo efeito de maré teria produzido calor suficiente para criar um oceano de água líquida subsuperficial. Esta fricção teria ainda provocado um ligeiro atraso nas marés relativamente à posição orbital de Plutão e Caronte, o que, por sua vez, teria desacelerado a rotação de Plutão e transferido a sua energia rotacional para Caronte, provocando a sua aceleração e, consequentemente, a sua migração para o exterior.

“Dependendo de como evoluiu exatamente a órbita de Caronte – em particular, se entrou numa fase de elevada excentricidade – poderá ter havido calor suficiente da deformação de maré para manter por algum tempo água líquida debaixo da superfície de Caronte” disse Rhoden. “Usando modelos da estrutura interior plausíveis, que incluam um oceano, descobrimos que não teria sido necessária muita excentricidade (menos de 0,01) para gerar fraturas na superfície como as que observamos em Europa.”

NewHorizons_Plutao_Caronte_artRepresentação artística da sonda New Horizons no sistema plutoniano.
Crédito: JHUAPL/SwRI.

Neste momento, a New Horizons encontra-se a caminho do sistema plutoniano. Em Julho do próximo ano, a sonda da NASA passará a aproximadamente 27 mil quilómetros de distância de Caronte, pelo que teremos, pela primeira vez, imagens em alta resolução da sua superfície.

“Uma vez que é tão fácil termos fraturas, se chegarmos a Caronte e não existir nenhuma, [tais observações] colocarão fortes limitações em quão alta a excentricidade poderia ter sido, e quão quente poderia ter sido o seu interior”, acrescentou Rhoden. “Esta investigação dá-nos um avanço relativamente à chegada da New Horizons – [mostra-nos] o que devemos procurar e o que podemos aprender com ela. Vamos a Plutão e Plutão é fascinante, mas Caronte irá ser também fascinante.”

A órbita de Caronte encontra-se agora num estado final de estabilidade, com as rotações de Plutão e de Caronte desaceleradas ao ponto dos dois corpos mostrarem sempre o mesmo lado um ao outro. Tal configuração não deverá gerar marés significativas no interior da lua de Plutão, pelo que qualquer oceano subsuperficial deverá estar nesta altura completamente solidificado.

Podem encontrar o artigo com todos os pormenores relativos a este trabalho aqui.

2 comentários

  1. Ter uma lua com um oceano de água líquida deveria justificar a “repromoção” de Plutão.

    Eu sei que os critérios são outros, mas é tão injusto!

    1. A suposta injustiça da “despromoção” de Plutão a planeta-anão, não é nada de novo e só revela um erro que levou à sua descoberta.

      A descoberta de Neptuno foi um feito da gravitação newtoniana e da matemática, com base em perturbações no movimento do planeta Úrano. Após a descoberta de Neptuno, pensou-se que a massa de Neptuno não seria suficiente para justificar as perturbações da órbita de Úrano pelo que se especulou que existisse um outro corpo a contribuir para essas perturbações.

      Quando se descobriu Plutão, rapidamente se constatou que tinha um tamanho minúsculo pois não foi possível medir o disco do planeta, aparecendo sempre como uma estrela; assim foi-lhe atribuída uma massa e densidade exageradas. Consoante os instrumentos de medida se foram aperfeiçoando, as dimensões e massa do planeta foram sendo ajustadas, sempre para baixo, até que a descoberta du um satélite natural, Caronte, veio revelar que a massa era mesmo muito inferior ao que se pensara antes.

      A descoberta de muitos outros corpos de tamanho e massas comparáveis a Plutão, para lá da órbita de Neptuno, a partir de 1992, veio criar uma situação insustentável. Sedna e Eris (este é maior que Plutão) deveriam ser também classificados como planetas?

      Este dilema também surgiu em 1800 quando se descobriu o asteróide Ceres, altura em que procurava um planeta entre Marte e Júpiter. Quando foram descobertos vários outros corpos em órbitas próximas (Pallas, Vesta, etc…) decidiu-se que esses corpos não seriam considerados planetas, sendo criada a classificação de “asteróide”.

      Na atualidade, perante um problema semelhante, criou-se uma nova categoria de objecto: o planeta-anão. Uma classificação aparentemente controversa mas, as pessoas acabarão por se habituar 😉

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