A Matéria Negra é Pouco Sociável

Na década de 30 do século XX, o astrónomo americano de origem suíça Fritz Zwicky descobriu que os movimentos das galáxias no interior de enxames só poderiam ser explicados se existisse uma enorme quantidade de matéria negra (invisível) envolvendo-as. Umas décadas mais tarde, nos anos 70, a astrónoma americana Vera Rubin descobriu que todas as galáxias se encontram rodeadas de halos gigantes de matéria negra. Rubin descobriu este facto notável ao observar que as estrelas na periferia das galáxias orbitam os respectivos centros com velocidades demasiado elevadas, só possíveis de explicar se estas “sentissem” o puxão gravitacional de um halo enorme de matéria negra que se extenderia muito para lá dos limites visíveis da galáxia.

A matéria negra interage com a matéria normal apenas através da força da gravidade e não emite nem absorve luz. Sabemos hoje que constitui cerca de 25% do conteúdo energético do Universo enquanto que a matéria normal, de que somos feitos, constitui apenas 5% . A sua natureza permanece um mistério e assunto de aceso debate e investigação. As teorias mais populares na literatura científica sugerem que é constituída por partículas elementares exóticas como neutralinos ou axiões.

Esta imagem mostra 6 dos enxames de galáxias estudados pela equipa de astrónomos liderada por David Harvey. Às imagens no visível obtidas pelo Hubble foram sobrepostas a emissão em raios-X devida ao gás quente intergaláctico e observada pelo Chandra (rosa) e a distribuição da matéria negra deduzida com base no efeito de lente gravitacional proporcionado pela massa enorme dos enxames (azul). Os enxames nas imagens são, da esquerda para a direita e de cima para baixo: MACS J0416.1–2403, MACS J0152.5–2852, MACS J0717.5+3745, Abell 370, Abell 2744, e ZwCl 1358+62. Crédito: NASA/ESA/STScI/CXC, D. Harvey (École Polytechnique Federale de Lausanne, Suíça; University of Edinburgh, Reino Unido), R. Massey (Durham University, Reino Unido), T. Kitching (University College London, Reino Unido), e A. Taylor e E. Tittley (University of Edinburgh, Reino Unido).

Esta imagem mostra 6 dos enxames de galáxias estudados pela equipa de astrónomos liderada por David Harvey. Às imagens no visível obtidas pelo Hubble foram sobrepostas a emissão em raios-X devida ao gás quente intergaláctico e observada pelo Chandra (rosa) e a distribuição da matéria negra deduzida com base no efeito de lente gravitacional proporcionado pela massa enorme dos enxames (azul). Os enxames nas imagens são, da esquerda para a direita e de cima para baixo: MACS J0416.1–2403, MACS J0152.5–2852, MACS J0717.5+3745, Abell 370, Abell 2744, e ZwCl 1358+62. Crédito: NASA/ESA/STScI/CXC, D. Harvey (École Polytechnique Federale de Lausanne, Suíça; University of Edinburgh, Reino Unido), R. Massey (Durham University, Reino Unido), T. Kitching (University College London, Reino Unido), e A. Taylor e E. Tittley (University of Edinburgh, Reino Unido).

Para melhor compreender a natureza da matéria negra os astrónomos utilizam meios cada vez mais sofisticados para observá-la em acção. Na revista Science de 27 de Março, um artigo descreve observações realizadas com os Telescópios Espaciais Hubble (visível) e Chandra (raios-X) por uma equipa de astrónomos com o intuito de estudar o comportamento da matéria negra presente em exames de galáxias quando estas estruturas colidem. Os resultados são particularmente interessantes pois mostram que os constituintes da matéria negra, quaisquer que sejam, para além de pouco interagirem com a matéria normal, interagem também muito pouco entre si.

As colisões entre enxames de galáxias duram centenas de milhões de anos. Para compreender como se desenrola um tal evento os astrónomos observaram 72 exemplos, em fases distintas da colisão. A equipa estava interessada em observar o comportamento da matéria negra dos enxames durante a colisão. Os enxames de galáxias têm 3 componentes principais: estrelas e nuvens de gás intergalácticas (matéria normal) e matéria negra. Durante uma colisão entre enxames as estrelas não são afectadas pois as enormes distâncias entre elas tornam colisões estelares altamente improváveis. As nuvens de gás, no entanto, ocupam um grande volume de espaço e colidem, diminuindo a sua velocidade devido a forças de fricção. O gás nestas nuvens encontra-se a temperaturas de milhões de Kelvin, emitindo abundantemente raios-X que são detectados pelo Chandra — foi assim que a equipa descobriu a distribuição das nuvens de gás durante e após as colisões. A distribuição das estrelas foi determinada estudando as imagens do Hubble, obtidas no visível. Curiosamente, a distribuição da matéria negra (invisível) foi determinada também com a ajuda do Hubble. Para tal os astrónomos usaram galáxias e quasares distantes cujas imagens são distorcidas e amplificadas pela lente gravitacional formada pela massa do enxame. O grau de distorção e amplificação observados dependem de forma sensível da distribuição de massa no enxame.

David Harvey, da École Polytechnique Fédérale de Lausanne (EPFL), na Suíça, e primeiro autor do artigo, diz-nos:

“Sabemos como o gás e as estrelas [nas galáxias] se comportam nestas colisões e onde emergem dos destroços. Comparar estes comportamentos com o da matéria negra [nas mesmas condições] pode ajudar-nos a descobrir de que é formada”.

A constituição da matéria negra permanece um mistério e alvo de intensa investigação. As teorias mais populares sugerem que é formada por partículas elementares designadas genericamente por WIMPs (Weakly Interacting Massive Particles), como o neutralino ou o gravitino, ou por partículas mais leves como os axiões. Crédito: Symmetry Magazine, Sandbox Studio, Ana Kova.

A constituição da matéria negra permanece um mistério e alvo de intensa investigação. As teorias mais populares sugerem que é formada por partículas elementares designadas genericamente por WIMPs (Weakly Interacting Massive Particles), como o neutralino ou o gravitino, ou por partículas mais leves como os axiões. Crédito: Symmetry Magazine, Sandbox Studio, Ana Kova.

Após a análise dos dados de ambos os telescópios, a equipa concluiu que, tal como as estrelas, a matéria negra manteve a sua trajectória durante a colisão, sem sofrer qualquer fricção que lhe abrandasse a velocidade. No entanto, e assumindo que a matéria negra é formada por partículas elementares, ao contrário das estrelas, isto não acontece porque as partículas estão muito afastadas entre si. As teorias dizem-nos mesmo que a densidade dessas partículas é elevada e que estas passam frequentemente próximo umas das outras. O facto de a matéria negra não ser afectada por estas colisões mostra que não só interage muito pouco com a matéria normal, nomeadamente com a matéria nas nuvens de gás que envolvem o enxame, mas também que as partículas que hipoteticamente a constituem interagem entre elas de forma muito débil. Esta é uma pista importante sobre a natureza destas partículas que permite aos físicos teóricos eliminar uma série de candidatos possíveis.

(Fonte: NASA/ESA/Hubble, Chandra)

1 comentário

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    • Nelson Adamowicz on 29/03/2015 at 02:12
    • Responder

    Dentro em breve descobriremos de que é formada a matéria negra.

    Nelso

  1. […] resultado vem no seguimento de um resultado recente desta equipa, que observou 72 colisões de enxames de galáxias (os enxames de galáxias podem […]

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