Descobrir a disposição exacta dos braços espirais da Via Láctea é difícil pois o Sol, e consequentemente a Terra, está imerso no disco da galáxia, no meio dos braços espirais. À nossa volta, e em todas as direcções, há imensa poeira interestelar que nos impede de observar em especial as regiões mais longínquas do disco galáctico. Para estudar a estrutura da Via Láctea, os astrónomos têm de recorrer a instrumentos capazes de observar no infravermelho, microondas e rádio para conseguir ver para lá desta parede de poeira. Um grupo de astrónomos liderado por Denilso Camargo, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, fez precisamente isso, utilizando dados de arquivo do observatório de infravermelhos WISE para identificar enxames de estrelas recém formados, marcadores ideais da localização dos braços espirais. Os resultados são consistentes com um modelo, suportado também por vários outros estudos, que sugere que a Via Láctea é uma galáxia espiral barrada com 4 braços principais.
Os braços espirais são regiões do disco da Via Láctea em que a densidade de material é maior. Este efeito é devido a ondas de densidade que percorrem o disco, e que têm origem na gravidade conjunta das estrelas e nuvens de gás da galáxia. Nestas regiões, o gás das nuvens de hidrogénio molecular é comprimido, provocando o seu colapso gravitacional e a consequente formação de estrelas jovens, muitas delas muito quentes, maciças e luminosas. É por esta razão que os braços espirais têm uma coloração azulada — as estrelas jovens mais quentes são azuladas — pontuados por manchas rosa — a cor do hidrogénio interestelar fluorescente devido à radiação ultravioleta destas estrelas. Estas estrelas são tão maciças e luminosas que vivem poucos milhões de anos, explodindo antes de se afastarem do braço espiral onde se formaram.
Seguindo esta lógica, para conhecer a disposição dos braços espirais, bastaria mapear a localização de concentrações de estrelas jovens quentes e maciças ou, melhor ainda, das maternidades estelares onde estas estrelas se formam. A equipa liderada por Denilso Camargo seguiu precisamente este último método, tirando partido do arquivo de imagens do telescópio de infravermelhos WISE (Wide-field Infrared Survey Explorer), da NASA. O WISE realizou um censo completo da esfera celeste no infravermelho durante 2 anos, descobrindo centenas de novos objectos, sendo que muitos outros permanecem ainda por descobrir no dito arquivo.
Os enxames jovens procurados pela equipa são muito luminosos no infravermelho e por isso facilmente detectados pelo WISE mesmo quando estão por detrás de grandes quantidades de poeira interestelar. A equipa identificou cerca de 400 objectos candidatos no arquivo do WISE. Para conhecer a sua localização no disco da Via Láctea, os astrónomos precisaram de determinar as suas distâncias à Terra. Para o efeito utilizaram dados de um outro censo, realizado a partir de observatórios na Terra, o 2MASS (Two-Micron All Sky Survey). Os resultados obtidos são favoráveis a um modelo, sugerido por vários outros estudos, de acordo com o qual a Via Láctea tem 4 braços espirais, com origem no seu bojo barrado central. Dois dos braços espirais, denominados de Perseu e Escudo-Centauro, parecem ser mais proeminentes e mais ricos em estrelas. Os outros dois, designados por Sagitário-Quilha e braço “Exterior” têm uma quantidade de gás semelhante aos outros dois mas parecem não ser tão ricos em estrelas.
Estas observações complementam informação sobre a estrutura espiral da Via Láctea obtida com radiotelescópios que são capazes de detectar a localização e trajectória orbital, em torno do centro da galáxia, de nuvens de hidrogénio atómico, e de observatórios sub-milimétricos, que detectam a localização de nuvens de hidrogénio molecular e poeiras, a matéria prima para formar novas estrelas. Todas estas observações, realizadas de forma independente, permitem ter uma imagem mais robusta da estrutura geral dos braços espirais da nossa galáxia.
(Fonte: JPL/NASA)
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