Um Par de Buracos Negros no Centro do Quasar Mais Próximo

Uma equipa de astrónomos utilizou observações da galáxia activa Markarian 231 no ultravioleta, extraídas do arquivo do Telescópio Espacial Hubble, para deduzir a existência de um sistema binário de buracos negros super-maciços no seu centro. Os astrónomos sugerem que o sistema se formou numa colisão entre Markarian 231 e uma galáxia mais pequena, há cerca de 1 milhão de anos. A colisão galáctica provocou um verdadeiro baby boom na Markarian 231, elevando a taxa de nascimento de novas estrelas para 100 vezes o observado na Via Láctea. Os dois buracos negros estão em rota de colisão e dentro de alguns milhares de anos darão origem a um dos eventos mais energéticos do Universo.

A galáxia activa Markarian 231. O brilho intenso do quasar no seu centro é bem visível nesta imagem obtida pelo Telescópio Espacial Hubble. O aspecto distorcido e os filamentos de cor azul formados por estrelas jovens e quentes, em especial junto ao núcleo, são fortes indícios de uma colisão galáctica. Crédito: NASA/ESA.

A galáxia activa Markarian 231. O brilho intenso do quasar no seu centro é bem visível nesta imagem obtida pelo Telescópio Espacial Hubble. O aspecto distorcido e os filamentos de cor azul formados por estrelas jovens e quentes, em especial junto ao núcleo, são fortes indícios de uma colisão galáctica. Crédito: NASA/ESA.

A galáxia Markarian 231 situa-se na constelação da Ursa Maior, próximo de Alioth ( ε da Ursa Maior), a primeira estrela da cauda, a uma distância de 600 milhões de anos-luz. O nome estranho deve-se ao facto de ser a número 231 num catálogo de galáxias com excesso de emissão de radiação ultravioleta, compilado pelo astrónomo arménio Benjamin Markarian, na década de 60 do século passado. Sabe-se hoje que estas galáxias contêm quasares nos seus núcleos e que são extremamente luminosas. Um quasar é composto por um buraco negro supermaciço (com milhões ou mesmo milhares de milhões de massas solares) e a sua região circundante, normalmente localizado no núcleo de uma galáxia. Quando um quasar está activo, o gás da galáxia (ou de outra galáxia durante uma colisão) é capturado pelo campo gravitacional do buraco negro e forma um disco de acreção em torno dele. O gás nesse disco orbita o buraco negro a alta velocidade e a fricção e o intenso campo electromagnético aquecem-no a temperaturas muito elevadas, provocando a emissão de radiação muito energética como raios gama, raios-X e os raios ultravioleta observados por Markarian.

Modelo de um quasar. No centro (disco negro pequeno) um buraco negro super-maciço mantém um disco de acreção formado por gás que cai no seu campo gravitacional. O centro do disco (amarelo) é aquecido até temperaturas na ordem dos milhões de Kelvin, emitindo abundantemente raios-X e raios ultravioleta. A maior distância do centro o disco de acreção aumenta a sua espessura e forma uma toro (azul) em torno do buraco negro. Este obstáculo força a emissão de radiação num cone relativamente estreito. É ainda visível, no centro do cone, um feixe de partículas emitido a partir da região central do disco e alinhado pelos fortes campos electromagnéticos. Crédito: ESA/NASA, Projecto AVO e Paolo Padovani.

Modelo de um quasar. No centro (disco negro pequeno) um buraco negro super-maciço mantém um disco de acreção formado por gás que cai no seu campo gravitacional. O centro do disco (amarelo) é aquecido até temperaturas na ordem dos milhões de Kelvin, emitindo abundantemente raios-X e raios ultravioleta. A maior distância do centro o disco de acreção aumenta a sua espessura e forma um toro (azul) em torno do buraco negro. Este obstáculo força a emissão de radiação num cone relativamente estreito. É ainda visível, no centro do cone, um feixe de partículas emitido a partir da região central do disco e alinhado pelos fortes campos electromagnéticos. Crédito: ESA/NASA, Projecto AVO e Paolo Padovani.

Antes desta descoberta sabia-se já que Markarian 231 tinha um quasar no seu núcleo, mas pensava-se que era energizado apenas por um buraco negro super-maciço. No entanto, quando analisaram as observações da radiação ultravioleta proveniente do núcleo da galáxia obtidas pelo Hubble, os astrónomos aperceberam-se de que havia algo de errado com este cenário. De facto, se existisse apenas um buraco negro no quasar no centro da Markarian 231, a radiação ultravioleta deveria ser intensa até ao centro do disco de acreção, junto ao buraco negro. Em vez disso, a equipa observou que na parte interior do disco a intensidade da radiação ultravioleta diminuia consideravelmente. Era como se o disco de acreção tivesse a forma de um donut, sem gás a altas temperaturas na região central. A explicação mais simples para as observações sugere que existem 2 buracos negros na região central, em órbita um do outro e que limpam essa região de gás. Um dos buracos negros, mais maciço e dominante, situa-se perto do centro do donut; o outro, menos maciço, situa-se na periferia do buraco do donut.

Representação artística do sistema binário de buracos negros no quasar da galáxia Markarian 231. Crédito: NASA/ESA e G. Bacon (STScI).

Representação artística do sistema binário de buracos negros no quasar da galáxia Markarian 231. Crédito: NASA/ESA e G. Bacon (STScI).

A análise dos dados permitiu determinar que o buraco negro central da Markarian 231, o dominante do sistema binário, tem cerca de 150 milhões de massas solares. O outro, presumivelmente o buraco negro central da galáxia canibalizada pela Markarian 231, tem cerca de 4 milhões de massas solares (sensivelmente a massa do buraco negro central da nossa galáxia). Os dois completam uma órbita em torno do centro de gravidade comum em apenas 1.2 anos. Dois corpos tão maciços, tão próximos e movendo-se tão rapidamente dissipam grande quantidade de energia sob a forma de ondas gravitacionais, com o consequente decaimento orbital — os buracos negros estão gradualmente a cair para o centro de gravidade do sistema. Os astrónomos estimam que irão colidir dentro de alguns milhares de anos, formando um buraco negro único e emitindo no processo uma quantidade inimaginável de energia sob a forma de ondas gravitacionais.

O artigo que descreve esta descoberta foi publicado no número de 14 de Agosto da revista The Astrophysical Journal.

(Fonte: hubblesite.org)

5 comentários

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  1. Excelente notícia!

    E as ondas gravitacionais ainda vão dar muito que falar… é pena é que só seja daqui a alguns milhares de anos :S

    • António Castanheira on 01/09/2015 at 22:53
    • Responder

    “Um quasar é um buraco negro ativo”

    Parto então do princípio que, quando um buraco negro absorve matéria (está ativo), forma-se um quasar e que, quando não está a absorver matéria, não se forma quasar (o buraco negro torna-se literal, digamos assim).

    Portanto, pode existir buraco negro sem quasar, mas não quasar sem buraco negro.

    “quando o Universo era mais jovem” – Esta parte não percebi.

    É verdade que muitos buracos negros estão a enormes distâncias e, por isso, quando os observamos olhamos o passado.
    Mas, no caso por exemplo deste Markarian, ele está *só” a 600 milhões de anos-luz, ou seja, quando o universo era só um pouco mais jovem.

    Julgo talvez que o Carlos possa ter querido dizer “quando o Universo era mais jovem” no sentido em que os quasares só se formam se houver matéria para absorver, antes de ser toda absorvida ou se dissipar pela expansão do universo.

    Assim, um hipotético observador que estivesse na Terra daqui a 10 mil milhões de anos (se ela existisse) talvez visse ao longo desse tempo Markarian fundir-se, formar um quasar gigante e depois extinguir-se…

    1. Sim, isso 🙂

    • António Castanheira on 01/09/2015 at 12:39
    • Responder

    O modelo gráfico do quasar que surge na 2ª imagem representa-o sobre um plano de 2 dimensões, a partir do qual os feixes de emissão e os cones aparecem num eixo perpendicular a esse plano.

    Mas o buraco negro é uma “esfera” emitindo feixes e cones em todas as direcções…Possivelmente é impossível representar graficamente esta realidade, sendo que o modelo apresentado destina-se apenas a tentar compreender o funcionamento do quasar.

    Outra questão:

    Está já comprovado definitivamente que um quasar é a face visível de um buraco negro? Por outras palavras, está já comprovado que não há quasar sem buraco negro, nem buraco negro sem quasar?

    1. Um quasar é um buraco negro ativo, ou seja, é o buraco negro mais o ambiente ao seu redor, nomeadamente quando o Universo era mais jovem 😉

      abraços

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