Rosetta observa evidências de um ciclo diário de gelo/vapor de água no cometa 67P/Churyumov–Gerasimenko

gelo_agua_temperatura_Hapi_67P_VIRTIS_Rosetta_set14Mapas do gelo de água (esquerda) e temperaturas (direita) em Hapi, na superfície do cometa 67P/Churyumov–Gerasimenko. As imagens baseiam-se em dados obtidos pelo instrumento VIRTIS da sonda Rosetta, a 12, 13 e 14 de setembro de 2014.
Crédito: ESA/Rosetta/VIRTIS/INAF-IAPS/Obs. de Paris-Lesia/DLR/M.C. De Sanctis et al (2015).

Cientistas descobriram evidências do que há muito suspeitavam – os cometas têm um ciclo diário de gelo/vapor de água sincronizado com o seu período de rotação. Baseada em observações realizadas pelo instrumento Visible, InfraRed and Thermal Imaging Spectrometer (VIRTIS) da sonda Rosetta, a equipa de investigadores liderada por Maria Cristina De Sanctis do Instituto de Astrofísica e Planetologia Espacial de Roma, em Itália, identificou uma região na superfície do cometa 67P/Churyumov–Gerasimenko onde o gelo de água aparece e desaparece num padrão cíclico que segue as condições de iluminação locais. Esta descoberta foi publicada no passado mês de setembro na revista Nature.

Os cometas são corpos celestes compostos por uma amálgama de poeiras e gelos, sobretudo de água, dióxido de carbono, monóxido de carbono, metano e amoníaco. À medida que viajam em direção ao periélio, os cometas são aquecidos pela radiação solar, provocando o aquecimento das camadas superficiais e a consequente volatilização dos gelos aí expostos. Os gases libertados pelo calor irrompem violentamente através da superfície, e arrastam consigo partículas de poeiras e pequenos fragmentos de gelo, formando assim as caudas e cabeleiras características dos cometas.

A Rosetta alcançou o cometa 67P/Churyumov–Gerasimenko em agosto de 2014 e tem estado a estudá-lo desde então. No passado dia 13 de agosto, o cometa atingiu o periélio, e está agora a deslocar-se em direção à região mais exterior do Sistema Solar. Um dos principais objetivos da missão era, precisamente, o de monitorizar o aumento da atividade na superfície e em redor de 67P/Churyumov–Gerasimenko, durante a sua aproximação ao Sol.

Neste novo trabalho, os cientistas analisaram um conjunto de observações realizadas pelo instrumento VIRTIS, em setembro de 2014, numa região com cerca de 1 km2 localizada no “pescoço” do cometa. Na altura, o cometa encontrava-se a cerca de 500 milhões de quilómetros de distância do Sol e o pescoço era uma das regiões mais ativas.

“Descobrimos um mecanismo que devolve à superfície gelo fresco a cada rotação”, explicou De Sanctis. “Isto mantém o cometa ‘vivo’.” O cometa leva cerca de 12,4 horas a completar cada rotação, pelo que as várias regiões na sua superfície passam por diferentes condições de iluminação ao longo desse período.

“Vimos a assinatura de gelo de água no espetro da região em estudo, mas apenas quando certas partes estavam na sombra.”, acrescentou De Sanctis. “Por outro lado, quando o Sol brilhava nestas regiões, o gelo desaparecia. Isto indica um comportamento cíclico do gelo de água durante cada rotação do cometa.”

ciclo_vapor_gelo_agua_superficie_67P_dados_RosettaCiclo do vapor/gelo de água no cometa 67P/Churyumov–Gerasimenko.
Crédito: ESA/Adaptado por Sérgio Paulino.

Os dados obtidos pela Rosetta mostram que o gelo nas camadas superficiais do cometa sublima quando exposto à radiação solar, transformando-o em gás que escapa em direção ao espaço. À medida que a noite cai, a superfície volta a arrefecer rapidamente. No entanto, as camadas inferiores retêm ainda algum do calor que receberam durante o dia, pelo que a água aí aprisionada continua a sublimar e a seguir o seu caminho até à superfície através do interior poroso do cometa. À medida que alcança a superfície, o vapor de água congela mais uma vez, formando assim uma fina camada de gelo fresco. O ciclo reinicia mais uma vez sempre que o Sol ilumina de novo estas regiões.

“Já suspeitávamos que pudesse ocorrer este ciclo da água nos cometas, com base nos modelos teóricos e em anteriores observações de outros cometas, mas agora, graças à Rosetta e à sua extensa monitorização do cometa 67P/Churyumov–Gerasimenko, temos finalmente provas observacionais”, disse Fabrizio Capaccioni, investigador principal do instrumento VIRTIS.

Baseados nestes dados, os investigadores puderam estimar a abundância relativa de gelo de água, no que diz respeito aos materiais que compõem o núcleo do cometa. O que descobriram foi que a água representa cerca de 10 a 15% dos materiais presentes nas camadas mais superficiais (até a alguns centímetros de profundidade) da região estudada, e parece estar bem misturada com outros constituintes.

A equipa usou ainda o sensor de micro-ondas MIRO para determinar a quantidade de vapor de água emitida pela região observada pelo VIRTIS. Os dados revelaram que, no período analisado, esta região produziu aproximadamente 3% da quantidade de vapor de água emitida pela superfície total do cometa. “É possível que várias áreas da superfície estivessem a passar pelo mesmo ciclo diário, providenciando assim contributos adicionais para a emissão total de gases do cometa”, explicou Capaccioni.

A sonda europeia tem a capacidade de detetar alterações no cometa a curto e a longo prazo, pelo que os investigadores estão agora a analisar os dados recolhidos nos meses mais próximos do periélio para perceberem qual terá sido o efeito do aumento da atividade no ciclo de gelo/vapor de água. Apesar destes resultados iniciais fornecerem apenas um vislumbre do funcionamento interno do cometa 67P/Churyumov–Gerasimenko, os cientistas esperam, em breve, com a ajuda da Rosetta, esclarecer de uma forma mais clara o contributo deste e de outros processos na evolução dos cometas.

Podem ler mais sobre este trabalho aqui.

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  1. […] de tamanho superior, entre 1,4 e 2,6 mm. Estas dimensões contrastam com os tamanhos inferiores anteriormente identificados nos grãos de gelo da região de Hapi, no “pescoço” do […]

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