Descoberta uma nova forma de luz.

Representação artística da propagação de luz oca no interior do feixe, com propriedades fermiónicas, ou da matéria. Crédito Getty Images/Cultura RF

Representação artística da propagação de luz oca no interior do feixe, com propriedades fermiónicas, ou da matéria.
Crédito Getty Images/Cultura RF

11 de maio de 2016

Os Físicos da Faculdade Trinity College de Dublin de Física e do Instituto Crann, igualmente do Trinity College, descobriram uma nova forma de luz, com impacto na nossa compreensão da natureza fundamental desta forma de radiação.

 

Nota de Contexto:

As partículas fundamentais do Modelo-padrão da Física de Partículas são excitações dos campos-forças e dividem-se em 2 famílias:

1- Bosões: partículas de energia sob a forma de radiação, que transportam, ou medeiam, essa informação, propagando-a nos campos-forças. Não têm massa invariante, e as que têm são as excepções da força fraca, levando à descoberta do Bosão de Higgs, para reequilibrar o jogo simétrico com as partículas do ponto 2.

Exemplos: Fotão, campo-força do Electromagnetismo, daí a palavra mais familiar fotão-grafia, ou fotografia. Bosão de Higgs, ou o Gluão que medeia a força forte, “gluando” e carrega a carga da cor. As propriedades destas partículas estão bem explicadas (numa ordem de precisão incrível) pelas estatísticas de Bose-Einstein. Têm momento angular intrínseco, ou spin de número inteiro (0,1,2), e devem a sua designação ao gigante indiano das Ciências, o Físico Satyendra Nath Bose, que deu o nome aos Bosões.

Por este spin que faz lembrar uma rotação, os bosões conseguem andar encavalitados no mesmo espaço, sendo indiferente a quantidade de fotões para se determinar o seu nível de energia. Ocupam o mesmo espaço sem problemas, são muito amigos uns dos outros.

2- Fermiões: partículas da energia sob a forma de matéria, que têm massa invariante, estão bem explicadas (numa ordem de precisão incrível) pelas estatísticas do Físico italiano Enrico Fermi, outro gigante das ciências que deu o seu nome a este grupo da matéria do dia-a dia.

Têm momento angular intrínseco, ou spin, de número fraccionado. Exemplos: os quarks, os neutrinos e os electrões, que têm spin de 1/2. Não se dão lá muito bem uns com os outros. Não gostam de ocupar o mesmo espaço e repelem-se entre si. Podem andar bem perto, numa valsa de spin oposto e de estrutura fina, ou até mesmo ultra-fina, mas nunca ocupam o mesmo espaço. Amigos amigos mas trajectórias à parte.

Resumo:

1) Bosões: radiações, spin de número inteiro.
2) Fermiões: matéria, spin de número fraccionado.

Uma das propriedades mensuráveis de um feixe de luz é o momento angular. Até agora, pensava-se que em todas as formas de luz o momento angular seria um múltiplo da Constante de Planck, a constante física da acção, que define a escala dos efeitos quânticos.

A constante da acção define as energias dos electrões, quando estes se apresentam mais calmos junto do núcleo dum átomo, ficando mais ligados a este (como um íman no frigorífico) ou quando estes estão excitados, e saltam para orbitais mais afastadas do núcleo do átomo, ficando mais soltos (também como um íman no frigorífico). Logo, ao definir o nível de energia, define também o espaço probabilístico específico que estes electrões vão ocupar na nuvem atómica, e define a distância a que ficam, probabilisticamente, do núcleo.

Como estes saltos dos electrões se registam, nesta explicação simplificada, à velocidade da luz, este saltitar fica muito bizarro, pois é tão depressa e em escalas tão pequenas que os electrões ocupam um espaço relativo muito grande e existem em 3 estados em simultâneo: onde estavam, para onde vão e o caminho que percorrem.

Absorvem fotões e a energia assim absorvida excita-os, mas têm tendência a regressar à calmaria (ao chamado estado fundamental), libertando energia sob a forma de luz, emitindo fotões.

Resumo: um electrão fica excitado e foge de casa, da nuvem atómica, ao absorver fotões; e fica calmo e regressa a casa ao libertar fotões.

Por isso, todas as partículas se definem como animais a brincar no parque.

Animais = partículas
A brincar = a interagir, entre elas e com o
Parque = os campos-forças

 

Mas eis que as experiências, baseadas na matemática bizarra e probabilística da mecânica quântica, nos reservam um descoberta incrível sobre a luz, nos quanta (quanta = plural de quantum) que a transportam, o fotão.

A Constante de Planck foi descoberta pelas cores associadas à luz, pelos fotões terem níveis de energia consoante são azuis (mais alta, temperatura mais elevada) ou vermelhos (mais baixa, temperatura menos elevada), o que não deixa de ser curioso porque é o contrário do que pensamos intuitivamente, a julgar pelas torneiras nas casas de banho.

Foi outro gigante, o dinamarquês Niels Bohr, quem associou o nível de energia da luz ao nível de energia dos electrões, construindo assim, num assomo fabuloso de presença de espírito, um modelo do átomo que finalmente explicava o átomo do Hidrogénio.

Modelo do átomo de Bohr.

Modelo do átomo de Bohr. Explicava os níveis de energia dos electrões e dos fotões do átomo do Hidrogénio, confirmando os quantas com as linhas de absorção e de emissão do espectro do elemento mais simples da Tabela Periódica. 

Modelo que estava de acordo com as linhas de emissão do átomo do Hidrogénio.

Emission_spectrum_H_annotated

Falámos de mecânica quântica, foi assim que esta saiu do seu estado pré-infantil (séculos 18 e 19) e cresceu para os computadores, laseres e sistemas de comunicação de fibra óptica dos nossos dias. Entre muitas outras aplicações da sua adolescência.

 

Vislumbramos hoje os primeiros sinais de maturidade e da idade adulta da mecânica quântica e relatamos o comunicado da Descoberta:

Agora, o recém doutorado Kyle Ballantine e o Professor Paul Eastham, ambos do Colégio de Física do Trinity College de Dublin, em conjunto com o professor John Donegan do Instituto Crann, demonstraram que existe uma nova forma de luz em que o momento angular de cada fotão (a partícula mediadora da luz visível) apresenta apenas metade desse valor. Essa diferença, embora pequena, é profunda. Estes resultados foram publicados recentemente na revista Science Advances.

Comentando sobre o seu trabalho, o Professor Assistente Paul Eastham acrescentou: “Nós estamos interessados em descobrir como poderemos mudar a forma como a luz se comporta, e como poderá isso ser útil. O que é tão emocionante neste resultado é que mesmo essa propriedade fundamental da luz, que os físicos sempre pensaram ser fixa, pode ser alterada “.

Já o Professor John Donegan exemplifica: “A minha pesquisa concentra-se na nanofotónica, que é o estudo do comportamento da luz à escala nanométrica. Um feixe de luz é caracterizado pela sua cor ou comprimento de onda e por uma quantidade menos familiar, conhecida como momento angular. O momento angular mede quanto algo está girando. Um feixe de luz, embora se propague em linha recta, pode também ser rotativo em torno do seu próprio eixo. Então, quando a luz do espelho atinge os seus olhos no despertar da manhã, cada fotão, de uma forma ou de outra, torce um pouco o seu olho. ”

Exemplo da fotónica no estudo da miopia num porquinho-da-índia. Colaboração: ResearchGate

Exemplo da fotónica no estudo da miopia num porquinho-da-índia.
Colaboração: ResearchGate

“A nossa descoberta vai ter impactos reais para o estudo das ondas de luz em áreas como a segurança das comunicações ópticas.”

O Professor Stefano Sanvito, Director do Instituto Crann, salientou: “O tema da luz sempre foi de interesse para os físicos, sendo ao mesmo tempo documentado como uma das áreas da física melhor compreendida. Esta descoberta é um avanço tanto para o mundo da física como para a ciência. Estou muito contente de ver mais uma vez o Instituto Crann e o Trinity College de Física produzirem pesquisa científica fundamental que desafia a nossa compreensão da luz. ”

Para fazer esta descoberta, a equipa envolvida usou um efeito descoberto na mesma instituição há quase 200 anos.

Na década de 1830, o matemático William Rowan Hamilton e o físico Humphrey Lloyd descobriram que, ao passar através de certos cristais, um raio de luz transforma-se num cilindro oco. A equipa usou este fenómeno para gerar feixes de luz com uma estrutura em parafuso.

[refere-se à refracção cónica, verificada em estruturas de cristais bi-axiais].

Refracção cónica, o fenómeno esquecido. TODOR KALKANDJIEV, CONEREFRINGENT OPTICS SL, BARCELONA, SPAIN

Refracção cónica, o fenómeno esquecido.
Todor Kalkandjiev, Conerefringent Optics SL, Barcelona, Spain

Analisando estes feixes à luz da teoria da mecânica quântica, previram que o momento angular do fotão seria um número fraccionado, e conceberam uma experiência para testar a sua previsão. Usando um dispositivo especialmente construído para esse objectivo, foram capazes de medir o fluxo do momento angular num feixe de luz. Também lograram, pela primeira vez, medir as variações desse fluxo causadas pelos efeitos quânticos. As experiências revelaram uma pequena mudança, 1/2 da Constante de Planck, no movimento angular de cada fotão.

Os físicos teóricos têm especulado desde a década de 1980 sobre a forma como a mecânica quântica funciona para as partículas que são livres de se moverem em apenas duas das três dimensões do espaço. Descobriram que isso permitiria novos e estranhos quanta, incluindo partículas cujos números quânticos seriam fracções dos espectáveis. Este trabalho demonstra, pela primeira vez, que estas especulações podem ser realizadas com a luz.

 

O artigo científico pode ser lido aqui.

Contacto com a imprensa:
Thomas Deane, Assessor de Imprensa para a Faculdade de Engenharia, Matemática e Ciências

Olaf Medenbach, Ruhr-Universität Bochum Atlas of Optical Crystallography Olaf Medenbach Institut für Geologie, Mineralogie und Geophysik Ruhr-Universität.

Olaf Medenbach, Ruhr-Universität Bochum Atlas of Optical Crystallography
Olaf Medenbach Institut für Geologie, Mineralogie und Geophysik Ruhr-Universität.

5 comentários

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    • Manel Rosa Martins on 25/06/2016 at 15:56
    • Responder

    Errata – QCD – Quantum Chromodynamics, que se foca na carga de cor dos quarks.

    • Manel Rosa Martins on 25/06/2016 at 10:51
    • Responder

    Caro David Carlos Sodré
    Um feixe de luz, embora se propague em linha recta, pode também ser rotativo em torno do seu próprio eixo. Já que cita o post cite também as partes que são relevantes para a trajectória da luz.

    Não há qualquer contradição com a Teoria da Relatividade Especial de Einstein, aliás trata-se aqui de mecânica Quântica relativista, mas nem cheguei a perceber se é isso que o apoquenta.

    Em relação à Teoria da Luz e das suas interações com a matéria, a obra e a Teoria de referência e de consenso é a QED – Quantum ElectroDynamics e a sequente unificação do Electromagnetismo em altas energias com a força fraca, na Electrofraca.

    Sugiro que consulte estes corpos de conhecimento, a tal precisão incrível referida no post.

    No estudo da Força nuclear e nuclear forte, tem a QCD, Quantum ChronoDynamics.

    Obrigado.

    • Divino Carlos Sodré on 25/06/2016 at 02:32
    • Responder

    – Obs.: Essa recente descoberta tem muito a ver com a experiência, aqui em epígrafe, mas e também, com uma estrita observação de Einstein sobre o caminho da luz no espaço – onde se concluiu o possível desvio da luz pelo fato mesmo do espaço apresentar-se curvo a princípio. Albert Einstein, inclusive, questionou a forma de como a luz se propagava no seu sistema vigente àquela época – a forma de propagação retilínea da luz no conceito newtoniano, e outros. A propósito de tudo que sabemos sobre a luz eu, particularmente, gostaria de conversar com alguém sobre algumas proposições a cerca da própria luz mas, e também, do espaço onde a mesma trafega.

    – Alguém se habilita??

    1 – Na década de 1830, o matemático William Rowan Hamilton e o físico Humphrey Lloyd descobriram que, ao passar através de certos cristais, um raio de luz transforma-se num cilindro oco. A equipa usou este fenómeno para gerar feixes de luz com uma estrutura em parafuso.

    [refere-se à refracção cónica, verificada em estruturas de cristais bi-axiais].

    2 -Agora, o recém doutorado Kyle Ballantine e o Professor Paul Eastham, ambos do Colégio de Física do Trinity College de Dublin, em conjunto com o professor John Donegan do Instituto Crann, demonstraram que existe uma nova forma de luz em que o momento angular de cada fotão (a partícula mediadora da luz visível) apresenta apenas metade desse valor. Essa diferença, embora pequena, é profunda. Estes resultados foram publicados recentemente na revista Science Advances.

    Comentando sobre o seu trabalho, o Professor Assistente Paul Eastham acrescentou: “Nós estamos interessados em descobrir como poderemos mudar a forma como a luz se comporta, e como poderá isso ser útil. O que é tão emocionante neste resultado é que mesmo essa propriedade fundamental da luz, que os físicos sempre pensaram ser fixa, pode ser alterada “.

    – Um grande abraço a todos

    • Divino Carlos Sodré on 24/06/2016 at 14:46
    • Responder

    Interessante

    • Manel Rosa Martins on 18/06/2016 at 11:35
    • Responder

    Os meus agradecimentos à Cientista Filipina Cecile G.Tamura pelo apoio documental científico prestado na preparação deste post.

    Muito Obrigado Cecile. 🙂

  1. […] das descobertas que relatámos da molécula de fotões e duma nova forma de luz com propriedades físicas da matéria, a Física não cessa de nos […]

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