Uma Supernova por Segundo

A frequência com que ocorrem supernovas nas galáxias não é muito bem conhecida. O valor depende de muitos factores, e.g., do tipo de galáxia, da luminosidade da mesma, do ritmo de formação estelar, da fracção de estrelas maciças. As melhores estimativas para a Via Láctea, baseadas na ocorrência de certos radio-isótopos disseminados pelas supernovas, sugerem que deve ocorrer uma em cada 50 anos. A maioria destes eventos não é observável a partir da Terra devido à grande quantidade de poeiras interestelares no disco galáctico (e.g., G1.9+0.3).

Com esta condicionante, sugiro ao leitor fazer um pequeno cálculo baseado numa estimativa, provavelmente muito conservadora, da frequência média de supernovas para uma qualquer galáxia no Universo: uma por milénio. Com este número em mente, se quiséssemos observar em média uma supernova por ano teríamos de monitorizar com os nossos telescópios 1000 galáxias. Se quiséssemos observar uma supernova por dia teríamos de observar uma amostra 365 vezes maior ou 365 mil galáxias. Continuando com este raciocínio, se quiséssemos observar uma supernova por segundo teríamos de monitorizar 60 (segundos) x 60 (minutos) x 24 (horas) x 365 mil galáxias, ou seja, aproximadamente 30 mil milhões de galáxias.

Uma supernova na galáxia NGC613, situada a apenas 67 milhões de anos-luz na direcção da constelação do Escultor. Crédito: Grupo i-Telescope Portugal.

Uma supernova na galáxia NGC 613, situada a apenas 67 milhões de anos-luz na direcção da constelação do Escultor.
Crédito: Grupo i-Telescope Portugal.

Este último número é quase da ordem de grandeza do número total de galáxias na porção do Universo que podemos observar. De facto, extrapolações feitas com base nas imagens do Hubble eXtreme Deep Field, as mais profundas que temos, apontam para cerca de 100 mil milhões de galáxias em toda a esfera celeste. Sendo assim, o cálculo simples que acabámos de fazer diz-nos algo de extraordinário: a cada segundo que passa, uma estrela explode numa supernova algures no Universo.

A supernova UDS10Wil, a mais distante conhecida, em imagens obtidas pelo Hubble. A luz da supernova viajou 10 mil milhões de anos para ficar registada na câmara do telescópio espacial. Créditos: NASA, ESA, A. Riess (Space Telescope Science Institute & Johns Hopkins University), D. Jones e S. Rodney (Johns Hopkins University).

A supernova UDS10Wil, a mais distante conhecida, em imagens obtidas pelo Hubble. A luz da supernova viajou 10 mil milhões de anos para ficar registada na câmara do telescópio espacial.
Créditos: NASA, ESA, A. Riess (Space Telescope Science Institute & Johns Hopkins University), D. Jones e S. Rodney (Johns Hopkins University).

Mas então, porque não vemos tantas supernovas com os nossos telescópios? A maioria das supernovas ocorre em galáxias muito distantes, demasiado longe para serem detectadas por telescópios terrestres. Os programas dedicados à detecção de supernovas usam telescópios de grande campo, para cobrir grandes regiões do céu, mas com aberturas modestas pelo que são capazes de detectar supernovas apenas até cerca de mil milhões de anos-luz. Os telescópios maiores são muito requisitados e cobrem campos bem mais pequenos pelo que não é prática a sua utilização para a detecção de supernovas, excepto em programas especiais.

De facto, a supernova mais distante detectada até à data é fruto de um desses programas, o CANDELS Ultra Deep Survey, que usa o telescópio Hubble para observar uma região muito pequena do céu. A luz da UDS10Wil, como foi designada, demorou 10 mil milhões de anos a viajar até nós antes de ser registada pelas câmaras do telescópio espacial. Mas o CANDELS UDS é uma excepção e apenas são conhecidas algumas centenas de supernovas para galáxias com tempos de viagem da luz entre 2 mil milhões e 10 mil milhões de anos.

É certo também que nem todas as supernovas em galáxias mais próximas são detectadas devido a factores como o movimento orbital da Terra (que torna partes do céu não observáveis devido à presença do Sol) e a poeira interestelar nas galáxias de origem que, tal como na Via Láctea, pode facilmente esconder mesmo explosões tão energéticas.

10 comentários

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    • Reinaldo da Silva on 25/10/2016 at 23:26
    • Responder

    Professor na ótica do senhor seria uma perca de recursos investir em uma sonda para investigar super novas?

    Desde já agradeço sua atenção.

    1. Enviar a sonda para onde? Para perto de estrelas que estejam perto de explodir?

      A radiação iria destruir os sistemas elétricos da sonda…
      … e a sonda só chegaria à estrela após alguns milhões de anos.

      Devido a isto, não faria sentido enviar sondas 😉

      abraços

    • Reinaldo da Silva on 22/10/2016 at 00:15
    • Responder

    Professor qual é a solução para que a humanidade possa finalmente ter condições para ver mais super novas?

    1. Porque quer ver mais supernovas? 🙂

        • Reinaldo da Silva on 24/10/2016 at 19:43

        Professor uma super nova poderia inclusive ampliar o limite conhecido do universo.
        Imagine uma explosão de uma super nova a 15, 17, 20 bilhões de anos luz.

      1. Não poderia, porque essa luz não teria tempo de chegar até nós 😉

        Note que nesses limites do Universo conhecido, o Universo expande-se a velocidades superiores à da luz 😉

        abraços!

        • Reinaldo da Silva on 24/10/2016 at 23:49

        Desculpe professor não quero ser repetitivo não, mas digamos então, poderíamos ter pelo menos uma explosão de super nova chegando a terra vindo de 15 bilhões de anos luz?

      2. A resposta mais simples seria dizer: não.
        O Universo tem 13,8 bilhões de anos. Supondo que vemos o Universo 13,8 bilhões de anos em todas as direções, então a luz dessa supernova estaria para lá daquilo que vemos. Ou seja, em condições normais, só veríamos a luz dessa supernova daqui a 1,2 bilhões de anos.

        Mas o nosso Universo Observável é muito superior a isso, devido à expansão do Universo.
        http://www.astropt.org/2009/12/15/tamanho-do-universo/

        A questão aqui seria: quando se deu essa supernova?

        abraços

    • Nillo Gallindo on 21/10/2016 at 13:47
    • Responder

    Luís Lopes,

    Gostei!
    Pela tua exposição podemos concluir que em tão vasto Universo as Super Novas são raras ainda hoje. Se são raras agora, sempre o foram desde o início da conversão de energia em matéria e/c2=m.
    Sendo assim, aquela teoria de que “no início” as explosões de Super Novas em grande número foi que ajudou a formar estrelas comuns não é viável pois, no início as Super Novas seriam raríssimas, como ainda são hoje. Algo que era tão raro não poderia ter contribuído para o aumento de subprodutos.

    Nillo Gallindo – Extrema – MG – Brasil

    1. Nillo,

      O texto diz que deverá existir 1 supernova por segundo no Universo conhecido.
      Isso não é raro. Isso quer dizer que estão sempre a existir. Isso é o oposto de raro.

      Se você ganhar 1 milhão de dólares todos os segundos, considera isso raro?

      Quanto ao “início”, nessa altura existiam muito menos estrelas de baixa massa. As estrelas eram maioritariamente maciças, o que faz com que existissem muito mais supernovas nessa altura.

      Ou seja, a sua argumentação para criticar a teoria evolutiva do Big Bang falhou por completo.

      abraços

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