Deteção do exoplaneta Qatar 1b

Representação artística do exoplaneta Qatar 1b. Crédito: David Aguila, Centro de Astrofísica de Harvard-Smithsonian.

Estará ao alcance de um astrónomo amador ter êxito na deteção de um exoplaneta? A resposta é afirmativa e vamos ver como pode ser feito.

Depois duma passagem pela técnica da velocidade radial, é chegado o momento de evoluir para outro método indireto: o trânsito.

De todas as configurações orbitais possíveis, existe uma em particular que ocorre quando o planeta passa à frente da sua estrela na orientação da nossa linha de visão. Este acontecimento, dá origem a um evento especial que nos permite deduzir vários parâmetros do sistema planetário e é conhecido pelo método do trânsito.

Em termos práticos, o trânsito é o único método de deteção de exoplanetas disponível para o astrónomo amador e o Qatar 1b foi o alvo escolhido: um Júpiter quente, bastante adequado para garantir uma boa relação entre o raio do planeta e o da estrela (~2%), facilitando a fase da fotometria.

Tudo começou pela força de vontade, coragem e determinação do Cédric Pereira, um apaixonado pela astronomia que decidiu alargar os seus conhecimentos e estrear-se no domínio da exoplanetologia. Teremos aqui um futuro caçador de planetas?

1. Aquisição de dados

  • Utilização de telescópio remoto em Itália, Celestron C14, através da Virtual Telescope. O custo de utilização deste telescópio é de 25 € por hora; porém, como alternativa, permito-me sugerir o observatório do João Gregório ([email protected]) para fazer a aquisição das imagens;
  • Foram feitas 98 fotografias com 90 segundos de integração, das 17h35 às 20h14 (i.e. com início ~30 minutos antes e depois do trânsito).

 

2. Ficha técnica do sistema em observação

  • Descoberta e referências: anunciado em 2011, por Alsusbai K.A., através do método do trânsito;
  • Parâmetros orbitais: período de 1,4 dias, ocorrendo um pouco distanciado do equador (83,5°);
  • Parâmetros do trânsito: raio semelhante ao de Júpiter (1,164 Rj), duração de 96,7 minutos e profundidade de 2,1%;
  • Propriedades estelares: raio inferior ao do Sol (0,823 Ms) e magnitude 12,8 V; e
  • Distância: 175 pc.
  • Informações pormenorizadas aqui.

 

3. Fotometria

  • A fotometria diferencial foi obtida através da utilização do MuniWin (freeware);
  • Foram utilizadas duas estrelas de comparação e uma de referência;

Mapa de identificação do exoplaneta e estrelas utilizadas na fotometria diferencial. Processamento: Ruben Barbosa.

 

4. Resultados obtidos

  • A curva de luz exibe duração e profundidade em linha com os dados de catálogo;
  • O raio obtido foi de 1,176 Rj (catálogo: 1,164 Rj);
  • A duração obtida foi de 96,5 minutos (catálogo: 96,7 minutos);
  • A forma em “V” resulta da inclinação do sistema ser inferior a 90°, o que significa que o trânsito ocorre distante do equador e o efeito de escurecimento do limbo torna-se mais acentuado;
  • Os resultados obtidos foram alvo de publicação no ETD (id 5039).

Curvas de luz do trânsito Qatar 1b. Processamento: Ruben Barbosa.

  • Os residuais, diferença entre a magnitude e a curva de luz, apresentam desvios absolutos inferiores a 0,015;

Residuais do trânsito do Qatar 1b. Processamento: Ruben Barbosa.

  • A massa de ar evoluiu desfavoravelmente ao longo da observação, mas sem comprometer os resultados;

Evolução da massa de ar durante o trânsito do Qatar 1b. Processamento: Ruben Barbosa.

  • Na vertical (direita), pode verificar-se que o Sol é ligeiramente maior que Qatar e que Júpiter tem um raio semelhante a Qatar 1b. Quanto à inclinação orbital, Júpiter é mostrado a 90° (alinhado com o equador) enquanto Qatar 1b surge a 83,36° (distanciado do equador);
  • Na horizontal (inferior), conclui-se que a inclinação orbital medida é bastante aproximada da de catálogo (83,47°);

Comparação de geometrias planetárias. Na vertical, o tamanho das estrelas e planetas; na horizontal, inclinação orbital de catálogo e medida. Processamento: Ruben Barbosa.

Das imagens anteriores evidencia-se uma curva de luz do trânsito harmoniosa. Por outro lado, os resultados obtidos estão em perfeita aproximação com os de catálogo, o que nos reconforta e motiva para novas aventuras. A partir da curva de luz, seremos capazes de deduzir todos os restantes parâmetros do trânsito e compreender melhor o sistema planetário: é este o desafio lançado nos próximos artigos, pormenorizando o método do trânsito. Enquanto isso, os interessados em desenvolver atividades práticas, nomeadamente aquisição de dados para deteção de exoplanetas via método do trânsito, podem contactar-me por mensagem através do AstroPT ou do Facebook.

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