O Covil de Eta Carinae

A Nebulosa de Carina, NGC 3372, fotografada no visível com o telescópio T8 do iTelescope, no Observatório de Siding Spring, na Australia.
Crédito: Grupo iTelescope-Portugal/aquisição, Luís Lopes/processamento.

A Nebulosa de Carina, também conhecida por NGC 3372, faz parte de um gigantesco complexo de formação estelar situado a cerca de 7500 anos-luz, na direcção da constelação austral homónima. É sem dúvida a mais espectacular nebulosa visível a partir da Terra mas, infelizmente, só é observável a partir de latitudes meridionais. Provavelmente por este motivo é menos conhecida do que a Nebulosa de Orionte. Para além de ser muito maior (450 anos-luz de extensão versus apenas 15 anos-luz) a população de estrelas maciças e luminosas da NGC 3372 ofusca por completo as luminárias de Orionte. A sua inquilina mais conhecida é a estrela Eta (η) Carinae, localizada na sua região central, um sistema binário extraordinário em que ambas as componentes são estrelas supergigantes azuis. A maior das duas estrelas tem mais de 100 massas solares e uma luminosidade bolométrica (em todos os comprimentos de onda do espectro electromagnético) de 5 milhões de sóis. É uma das estrelas mais luminosas e temperamentais da Via Láctea.

Os enxames de estrelas associados à Nebulosa de Carina.
Crédito: Grupo iTelescope-Portugal/aquisição, Luís Lopes/ processamento e anotações.

Imersos na nebulosa existem vários enxames de estrelas com diferentes idades, evidência de que a formação de novas estrelas nela se processa há dezenas de milhões de anos. Alguns dos enxames são anormalmente ricos em estrelas dos tipos espectrais O2 e O3 — as mais quentes, maciças e luminosas. Estas estrelas são tão raras que as características do tipo O3 só foram definidas pelos astrofísicos em 1971 e as do tipo O2 apenas em 2002!

Este diagrama de Hertzsprung-Russell relaciona a temperatura superficial das estrelas (eixo horizontal) com a sua luminosidade (eixo vertical). Note que a temperatura aumenta da direita para a esquerda. As estrelas de tipo O são as mais quentes, maciças e luminosas e situam-se no canto superior esquerdo do diagrama. Dentro deste tipo, as estrelas de tipo O2 e O3 são raríssimas e com as características mais extremas.
Crédito: Astronomy Magazine.

Eta Carinae faz parte de um dos enxames, o Trumpler 16, juntamente com HD 93162, um sistema binário com uma estrela de Wolf-Rayet e uma supergigante de tipo espectral O4, o mais luminoso conhecido na Via Láctea.

Um outro enxame mesmo ao lado, Trumpler 14, é extremamente jovem, com uma idade estimada de apenas 600 mil anos. Este enxame contém a estrela HD 93129A, um sistema triplo com duas supergigantes de tipo O2 (conhece-se apenas uma mão cheia destas estrelas na Via Láctea!) e uma estrela de tipo espectral O3, com uma luminosidade total que excede 2 milhões de sóis.

A nebulosa contém ainda os enxames Trumpler 15, Collinder 228, Collinder 232, Bochum 10, Bochum 11, NGC 3324 e NGC 3293, todos eles mais evoluídos do que Trumpler 14 e 16, com vários milhões de anos de idade.

Quando um electrão num átomo de hidrogénio salta para uma configuração de energia mais baixa (valor de “n” mais baixo) emite a energia em excesso sob a forma de um fotão com um comprimento de onda característico. Quando o salto é para o nível mais baixo (n=1) os fotões emitidos são ultravioletas (série de Lyman). Para o nível seguinte (n=2) os fotões são visíveis e formam a série de Balmer. Os fotões H-alfa são emitidos na transição de n=3 para n=2 e têm um comprimento de onda de 656.3 nanometros.
Crédito: Wikipedia.

A imagem seguinte da Nebulosa de Carina foi obtida com um filtro que deixa passar apenas luz numa banda muito estreita de 5 nanometros em torno do comprimento de onda de 656.3 nanometros, na região do vermelho no espectro visível, que os astrónomos chamam H-alfa. A luz com este comprimento de onda é emitida por átomos de hidrogénio excitados quando o electrão que se encontra no 3º nível de energia retorna ao 2º nível. Relativamente à primeira fotografia, o filtro elimina grande parte da luz emitida pelas estrelas, que emitem em todos os comprimentos de onda, e facilita o registo das grandes nuvens de hidrogénio, o principal ingrediente de que são feitas as estrelas. O aspecto turbulento do gás, que forma grandes bolhas com dezenas ou centenas de anos-luz, deve-se à radiação ultravioleta intensa, emitida pelas estrelas mais quentes e luminosas nascidas na nebulosa, que ioniza e empurra o gás esculpindo na nebulosa original formas bizarras. Os filamentos negros, sobrepostos à nebulosa, são formados por gás e poeira interestelar, tudo o que resta da nuvem de hidrogénio molecular original de onde se formaram os enxames acima referidos.

A Nebulosa de Carina, NGC 3372, fotografada em luz H-alfa com o telescópio T8 do iTelescope, no Observatório de Siding Spring, na Australia. O enxame NGC 3293 pode ser visto em baixo à direita.
Crédito: Grupo iTelescope-Portugal/aquisição, Luís Lopes/processamento.

Referências: No Limite da Estabilidade (ler mais sobre Eta Carinae).

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