
Astronomia do Povo Boorong
Para o povo aborígene australiano, que existiu até ao final do século XVIII, o ritmo do aparecimento das constelações indicava a chegada das estações do ano.
Ao longo do ano o Sol está à frente de determinadas constelações. Ou seja, “aponta” para elas. Uma constelação que nasce no leste, antes do Sol, vai-se elevando na abóbada progressivamente. Após três meses já está no zénite, à meia-noite. Seis meses depois de “nascer” estará do outro lado, a “pôr-se” depois do Sol. Estes ciclos forneciam predições ao povo Boorong:
Já que o ano para este povo se iniciava em Março, começamos também as referências nesse mês.
Março: O emu (pássaro australiano) nasce. O nome da constelação que apontava para essa altura do ano era o Tchigal, formado pelas nossas constelações Centauro, Lobo e Escorpião. Esta constelação estaria perto do zénite ao anoitecer e no horizonte à meia-noite. Os boorongs perceberam que, quando Tchingal surgia, os emus fêmeas punham ovos e os chocavam.
Ainda em Março nasciam os gambás-de-cauda-de-anel, que eram procurados pela sua pele. Este animal era representado pela constelação Bunya, que corresponde ao nosso Cruzeiro do Sul. O sinal era quando esta constelação aparecia no ponto mais alto à meia-noite.
Junho: A Constelação Tourtchinboingerra, visível ao norte às 21h representava a Alvéola Willie, que punha os seus ovos entre Junho e Fevereiro.
Julho: War, a constelação que estava perto do horizonte e indicava ao povo aborígene a postura dos ovos dos corvos entre Julho e Setembro.
Agosto: No zénite a partir das 22h, a constelação Totyarguil indicava a postura dos ovos do periquito-de-cabeça-roxa, até Dezembro.
Setembro: A constelação Marpeankurrk, a formiga gigante, no que conhecemos como Arcturus sinalizava o aparecimento abundante de larvas de cupim. Por coincidência, quando a constelação desaparecia da abóbada, as larvas também desapareciam.
Outubro: Antes do amanhecer aparecia a constelação de Neilloan, o Ser Criador, representando uma galinha australiana, a mallee. Nesta altura as crianças boorongs podiam ir em busca dos ovos das mallee.
Novembro: No início do Verão australiano era a altura da constelação do peixe Otchocut desaparecer do céu depois do Sol também desaparescer. Otchocut corresponde à nossa constelação do Golfinho e era a época dos boorongs viajarem até ao rio Murray para percarem o bacalhau que, depois de acasalar e desovar, fica preso em poças do rio que vai secando.
Dezembro: De seguida entrava em foco a constelação Wanjel, junto à estrela Pollux. Era altura de o jabuti-de-pescoço-longo pôr os ovos. Wanjel aparecia no Nordeste ao anoitecer.
Janeiro: A meio do Verão destacava-se Purra, a constelação que representava o canguru-vermelho. Purra situa-se perto da estrela Capella, na constelação Auriga
Fevereiro: Situado no zénite durante a noite, a constelação de Unurganite indicava a abundância de lagartos nesse mês.
A mitologia aborígene aparece a estrela sigma de Cão Maior, que representa um lagarto com duas esposas e ainda Sírius, que representa o maior pássaro australiano, a águia-de-cauda-em-cunha. A Via Láctea era o fumo das fogueiras acesas pelos seres mitológicos. A estrela Rigel, na constelação de Órion e a estrela Eta Carinae também eram ilustradas na mitologia boorong.
Os aborígenes ainda consideravam que o Sol, chamado Gnowee, tinha a sua origem numa gema de ovo levado por um pássaro. Gnowee morria todas as tardes e renascia sempre no dia seguinte. A Lua representava um marsupial que parece um gato.
Para saber mais:
Australia’s first astronomers
BRUNO MAÇÃES E DANTE GRECCO Scientific American Brasil Especial: Etnoastronomia (14)
Anexo daqui
Em anexo está uma tabela do nome da constelação Boorong, a explicação pelo povo aborígene e ainda a sua correspondência à astronomia moderna:
| NAME |
EXPLANATION |
CELESTIAL CLUE |
| Berm-berm-gle | Red-kneed dotterel | Alpha and Beta Centauri |
| Boorong | Night; small mallee; starry firmament | Starry firmament at night |
| Bunya | Ring-tail possum | Top star in Southern Cross |
| Chargee Gnowee | Elder sister, sister of the sun | Venus |
| Bittur | Larvae of the woodant | – |
| Collenbitchick | Species of ant | Double star in head of Capricornus |
| Collowgulloric War | Female crow, wife of War | Eta Carinae |
| Colowgulloric Warepil | Female eagle, wife of Warepil | Rigel In Orion |
| Djuit | Red-rumped parrot | Antares |
| Gellarlec | Pink cockatoo | Aldebaran |
| Ginabongbearp | Sulphur crested white cockatoo; pulling up daylight | Jupiter |
| Gnowee | Day; Sun | Sun |
| Karik Karik | Spear thrower; Australian Kestrel | Two stars at end of Scorpius |
| Kourt-chin | Male and female brolga | Clouds of Magellan |
| Kulkanbulla | Two teenage boys | Belt and Scabbard of Orion |
| Lamankurrk | Girls, young women | Pleiades |
| Marpeankurrk | Meat ant; treecreeper | Arcturus |
| Millee | Murray River | Part of the Milky Way |
| Mindi | The maned snake | Part of the Milky Way |
| Mityan | Quoll | Moon |
| Neilloan | Mallee fowl | Lyra |
| Nurrumbunguttias | Old man, black faced mallee kangaroo | White aura of the Milky Way |
| Otchocut | Great fish | Delphinus |
| Porkelong toute | Loss of tooth | Shooting star |
| Pupperimbul | Diamond firetail finch or shy hylacola | Carried the emu egg to become the Sun |
| Purra | Red kangaroo | Capella |
| Tchingal | The tall one; emu | Dark space near Cross |
| Totyarguil | Purple crowned lorikeet | Altair |
| Tourchingboiongerra | Needlewood hakea and willie wagtails | Coma Berenices |
| Tourte | Star | Any star |
| Tyrille | Space; night sky | Space; night sky |
| Unurgunite | Jacky lizard | Sigma Canis Major |
| Wanjel | Long-necked tortoise | Pollux |
| War | Crow | Canopus |
| Warepil | Wedge tailed eagle | Sirius |
| Warring | Galaxy | Milky Way |
| Weetkurrk | Singing bushlark | Star in Bootes west of Arcturus |
| Won | Boomerang | Corona Australis |
| Yerredetkurrk | Owlet nightjar | Achernar |
| Yurree | Fan-tailed cockatoo | Castor |


3 comentários
Author
De facto refere-se a ave que voa.
Por favor altere a última frase para “De qualquer modo são apenas e só pormenores para alcançar a excelência”
Obrigado
Penso que o Emu é o maior pássaro nativo da Austrália e a segunda maior ave que existe hoje, logo atrás da avestruz.
Quando disse isto “(…)que representa o maior pássaro australiano, a águia-de-cauda-em-cunha” provavelmente quereria dizer que a águia-de-cauda-em-cunha é a maior ave de rapina da Austrália?
São apenas pormenores, mas de resto gosto muito desta iniciativa…
Abraço