A melhor evidência observacional até à data da primeira geração de estrelas no Universo

O VLT descobre CR7, a galáxia distante mais brilhante, e indícios de estrelas de população III

Com o auxílio do Very Large Telescope do ESO os astrónomos descobriram a galáxia mais brilhante observada até hoje no Universo primordial e encontraram evidências fortes de que este objeto contém estrelas da primeira geração.
Estas estrelas massivas e brilhantes, puramente teóricas até agora, foram as criadoras dos primeiros elementos pesados na história — os elementos necessários à formação das estrelas que nos rodeiam atualmente, os planetas que as orbitam e a vida tal como a conhecemos.
A galáxia recentemente descoberta chamada CR7 é três vezes mais brilhante do que a galáxia distante mais brilhante que era conhecida até agora.

Impressão artística de CR7: a galáxia mais brilhante do Universo primordial. Crédito: ESO/M. Kornmesser

Impressão artística de CR7: a galáxia mais brilhante do Universo primordial.
Crédito: ESO/M. Kornmesser

Os astrónomos desenvolveram há muito a teoria da existência de uma primeira geração de estrelas – conhecidas por estrelas de População III — que teriam nascido do material primordial do Big Bang.

O nome População III vem do facto dos astrónomos já terem classificado anteriormente as estrelas da Via Láctea como sendo de População I (estrelas como o Sol, ricas em elementos pesados e que formam o disco da galáxia) e de População II (estrelas mais velhas, com baixo conteúdo de elementos pesados e encontradas no bojo e no halo da Via Láctea e em enxames globulares).

Todos os elementos químicos mais pesados — como o oxigénio, azoto, carbono e ferro, que são essenciais à vida — formaram-se no interior das estrelas, o que significa que as primeiras estrelas se devem ter formado dos únicos elementos que existiam antes delas: hidrogénio, hélio e traços mínimos de lítio.

Estas estrelas de População III seriam enormes — várias centenas ou mesmo milhares de vezes mais massivas do que o Sol — extremamente quentes e transientes — e explodiriam sob a forma de supernovas após cerca de apenas dois milhões de anos. No entanto, e até agora, a busca de provas físicas da sua existência tinha-se revelado infrutífera.

Uma equipa liderada por David Sobral, do Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço, Universidade de Lisboa, e do Observatório de Leiden, Holanda, utilizou o Very Large Telescope do ESO (VLT) para observar o Universo primordial, no período conhecido por época da reionização, que ocorreu cerca de 800 milhões de anos após o Big Bang. Em vez de fazer um estudo profundo e direccionado a uma pequena área do céu, a equipa alargou o seu foco de estudo produzindo o maior rastreio de galáxias muito distantes alguma vez obtido.

Este extenso estudo fez uso não apenas do VLT, mas também do Observatório W. M. Keck, do Telescópio Subaru e do Telescópio Espacial Hubble da NASA/ESA. A equipa descobriu — e confirmou — um número surpreendente de galáxias brilhantes muito jovens. Uma delas, chamada CR7, trata-se de um objeto excepcionalmente raro, de longe a galáxia mais brilhante alguma vez observada nesta época do Universo. Com a descoberta da CR7 e outras galáxias brilhantes, o estudo era já um sucesso, no entanto investigação posterior produziu mais resultados ainda melhores.

O nome CR7 é uma abreviação do COSMOS Redshift 7, uma medida do lugar ocupado em termos de tempo cósmico. Quanto maior o desvio para o vermelho (redshift), mais distante estará a galáxia e mais para trás no tempo da história do Universo se encontra também. A A1689-zD1, uma das galáxias mais velhas alguma vez observada, por exemplo, tem um desvio para o vermelho de 7,5.
O nome foi inspirado no jogador de futebol português, Cristiano Ronaldo, que é conhecido por CR7.

A CR7 é três vezes mais brilhante que a anterior detentora deste título, Himiko, que se pensava ser uma galáxia única nesta época tão primordial do Universo. Galáxias poeirentas, em épocas mais tardias, podem irradiar muito mais energia do que a CR7 sob a forma de radiação infravermelha emitida pela poeira quente. A energia emitida pela CR7 é essencialmente radiação ultravioleta/visível.

Com o auxílio dos instrumentos X-shooter e SINFONI montados no VLT, a equipa encontrou forte emissão de hélio ionizado na CR7 mas — crucial e surpreendentemente — nenhum traço de elementos mais pesados no seio da galáxia brilhante, o que constitui uma forte evidência da existência de enxames de estrelas de População III com gás ionizado, no seio de uma galáxia do Universo primordial.

“A descoberta superou, desde o início, todas as nossas expectativas,” disse David Sobral, “uma vez que não esperávamos encontrar uma galáxia tão brilhante. Seguidamente ao desvendarmos pouco a pouco a natureza da CR7, percebemos que não só tínhamos descoberto a galáxia distante mais brilhante conhecida até agora, como também que este objeto tinha todas as características que se esperam de estrelas de População III. Estas estrelas são as que formaram os primeiros átomos pesados que, em última análise, são os que nos permitem aqui estar. Este estudo revelou-se extremamente interessante.”

No seio da CR7 encontraram-se tanto enxames de estrelas mais azuis como também alguns mais vermelhos, o que indica que a formação das estrelas de População III ocorreu de forma faseada — como se previa. O que a equipa observou de modo direto foi o último período de estrelas de População III formadas, sugerindo que tais estrelas devem ser mais fáceis de detectar do que o que se pensava anteriormente: estas estrelas encontram-se no meio de estrelas regulares, em galáxias mais brilhantes, e não apenas nas galáxias mais ténues, pequenas e precoces, as quais são tão ténues que se tornam extremamente difíceis de estudar.

Jorry Matthee, segundo autor do artigo científico que descreve estes resultados, conclui: “Sempre me perguntei de onde é que nós vimos. Mesmo quando era pequeno queria saber donde vinham os elementos químicos: o cálcio dos meus ossos, o carbono dos meus músculos, o ferro do meu sangue. Descobri que estes elementos foram formados inicialmente no início do Universo, pela primeira geração de estrelas. Com esta descoberta estamos a ver, de facto, tais objetos pela primeira vez.”

Estão planeadas mais observações com o VLT, o ALMA e o Telescópio Espacial Hubble de modo a confirmar sem sombra de dúvidas que o que se observou são estrelas de População III e procurar e identificar outros exemplos.

Este é um artigo do ESO, que pode ser lido aqui.

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  1. […] Crédito e citação: ESA/ESO. […]

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