Panspermia: Duas Estratégias de Evolução

Há cerca de um ano e meio, frequentava a cadeira de Virologia no Instituto de Higiene e Medicina e Tropical. Nessa altura aprendi que um retrovírus é aquele que pode incorporar-se no genoma humano. O HIV é um retrovírus e incorpora-se no DNA através duma molécula chamada transcriptase reversa.

O DNA replica-se com a ajuda de alguma maquinaria celular. Um dos componentes é uma transcriptase – telomerase – , muito importante nas pontas dos cromossomas pois permite que essas pontas, os telómeros, permaneçam no cromossoma promovendo estabilidade… e velhice. A transcriptase reversa “pega” num molde de RNA e transcreve-o para DNA, fabricando trechos de DNA.

O material genético do retrovírus é RNA. Para que possa incorporar o DNA necessita de uma transcriptase reversa para utilizar o seu próprio genoma de RNA e transcrevê-lo para DNA.

Nessa altura surgiu-me uma questão. Se o HIV se incorpora no genoma, então se o portador de um HIV incorporado tiver descendência esse trecho poderá ser copiado para a descendência. Assim, uma criança que nunca teve em meios de perigo para contaminação com HIV poderá, mesmo assim, ter a doença? Basta para isso esse trecho de DNA começar a transcrever.

Até que ponto conhecemos os organismos e a sua capacidade de nos contaminarem ou a capacidade de serem contaminados por nós? Até que ponto um meio pode incorporar componentes biológicos e gerar uma estrutura biológica estável a ponto de poder evoluir e.. viver? Poderá ter havido alguma incorporação deste género no passado biológico da Terra. Podemos ver alguns exemplos neste post e, ainda, neste.

Um câncro é um outro mecanismo de evolução, mas numa versão rápida. Uma mutação por raios UV pode promover uma mutação e a imortalidade de uma célula e torna-se indefinidamente replicativa. Tem a capacidade de transformar o seu meio para que possa ser mais eficiente. Em vez de se adaptar ao meio, transforma-o à sua medida e a ponto de as células envolventes não terem as capacidades necessárias de enviar sinais de perigo e defesa para as células vizinhas.

A panspermia pode ter ocorrido, faz sentido.

9 comentários

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    • Agostinho Magalhães on 27/07/2011 at 15:12
    • Responder

    De tudo o que li aqui, de tudo o que tenho lido sobre estes assuntos, aqui e ali, acho que a opinião do Dário está correcta, apesar de eu não ter formação técnica sobre estes assuntos! Espero que o Dário continue a investigar este pensamento por que me parece ser o que mais se aproxima da realidade informativa de que dispomos até ao momento.
    Abraços

  1. De facto, o Marco e a Ana têm toda a razão quanto aos vírus. O HIV infecta o TCD4+ de pessoas normais (no entanto as pessoas com mutação no gene da proteina de superfície CCR5 do TCD4+ são apenas portadores e não infectados. Sortudos dos mutantes :op)

    O meu ponto de vista quanto à panspérmia é que não é necessário um asteróide carregar todos ou grande parte dos componentes para o apareceimento de vida. Apenas é necessário criar um ambiente diferente. Já que mudança gera mudança as vesículas, ao deparar-se com um novo ambiente, vão competir e vão adaptar-se ao novo ambiente. A evolução é isso mesmo: adaptação e competitividade num ambiente que as promova. Mutações que promovem alterações rápidas existem. Os exemplos que dei mostram que não é preciso vir tudo do espaço e que pode ter vindo apenas a faisca para tudo começar.

    1. Acho o mesmo 😉 mas considero q a faísca foi mais ao estilo de semear alguns ingredientes, quiçá um microorganismo. Mas uma coisa é semear, como a panspermia defende, outra coisa é já a evolução molecular ao nivel da que descreves. Aí é a propria natureza a mexer-se, claro, mas se não se pudesse mexer e se esses fenómenos não fossem viáveis, não haveria vida na Terra 😀

  2. Sinceramente, não entendi muito bem o post (sou 100% leigo no assunto de vírus. Ok, sou 99% leigo…).

    Ou, se entendi, é que vírus deixaram suas assinaturas no DNA humano (e outros?), e talvez (?) alguma coisa que tenha vindo do espaço. Seria isso? Então a panspermia poderia ter acontecido, se considerarmos o “lixo” do DNA como assinatura de moléculas complexas vindo do espaço? Passei perto, pelo menos?

    Se for isso, é intrigante…

    O que me fez lembrar da navalha de occam. E como, se usada na época que essa ferramenta foi criada, idéias como a panspermia poderiam ser consideradas então como absurdas.

    Mas descobertas de exoplanetas e componentes da vida no espaço promovem e elevam a idéia da panspermia…

    … E da hipótese da visitação ET ao nosso mundo (ou dirão que elas – as últimas descobertas – não ajudam a muitos a acreditarem que somos visitados?).

    No final, é o tempo, a quantidade e a qualidade de informação que possuímos agora que determinam o que é ou o que não é “econômico”. E, por consequência, o que a navalha pode ou não “cortar fora”.

  3. O HIV infecta linfócitos T, como diz o Marco, ou seja, incorpora-se no material genético dos linfócitos. Linfócitos esses que deixam de cumprir a sua função protectora, daí o sindroma de imunodeficiencia 😉 Mas, o HIV não se incorpora nas células sexuais do individuo, por isso a descendencia não vai ter esse DNA infecto.

    Não é o caso em outros retrovirus, com efeito, como o Marco já explicou. E tendo em conta que os próprios vírus podem induzir mutações (exemplo: o papiloma vírus humano é o responsável pelo cancro do colo do útero), não é descabido, q os vírus provoquem mutações e se incorporem na linha germinativa do organismo, passando-o à descendencia.

    Qto onde o Dário quis chegar, concordo. 😉 Como já disse diversas vezes, acho que temos dados suficientes para colocar a hipótese de que a vida poderia ter evoluido sem a intervenção da panspermia. Mas, como eu disse, poderia, caso não tivesse existido panspermia. Temos demasiados dados sólidos a apontarem para a hipótese de panspermia, pelo que esta terá ocorrido. Assim, a vida na Terra não terá evoluido nem somente por si só nem somente por panspermia. Estando os dois mecanismos disponiveis, a vida iniciou-se através dos dois. As moléculas necessárias, por exemplo, de certeza que tanto chegaram à Terra nos meteoritos que a bombardearam constantemente, como foi evoluindo com o que a Terra teria por si. Dito de outra forma, não só a Terra pode ter sintetizado por evolução molecular alguns aminoácidos e nucleótidos, como outros podem ter sido semeados panspermicamente.

    Ambas as hipóteses são totalmente válidas (ou a evolução molecular nunca teria sido possivel, caso a vida, por si, não se desenrolasse); a panspermia poderá ter tido um papel mais preponderante ao semear moléculas essenciais, quiçá semear algum organismo q tenha sobrevivido a viagens no espaço… e a evolução na Terra fez o resto. A panspermia poderá ser vista tb como um gatilho, ao semear o que poderia estar a faltar, ou ao aumentar a sua quantidade disponivel, ou até ao semear moléculas q serviriam de molde.

    Mas se a vida poderia ter surgido sem panspermia? Num sentido restrito (porque, convenhamos, num sentido mais lato tudo veio do espaço e tudo foram sementes do espaço), e após a formação da Terra, com as condições e moléculas q teria disponiveis depois da sua formação, podia. Mas…não era a mesma coisa 😛

    De qq forma acho um bocado impossível que não tenha havido panspermia. Pois se a Terra era constantemente bombardeada por “sementes”… O que não acho é que tenha sido o único mecanismo a levar ao aparecimento das biomoléculas que conhecemos como essenciais à vida na Terra.

    E a evolução, essa, processou-se essencialmente pelos mecanismos terrestres (ok, ok, tirando as vezes em q os meteoritos ditaram o sentido da evolução, fazendo desaparecer dinossauros e permitindo que os mamíferos se desenvolvessem… LOL! uma única pedrada e tau, lá muda o curso da evolução). Mas, se algum vírus tiver cá chegado numa pedra (os geólogos destestam que lhes chamemos pedras, ihihih, ok, ok, rochas 😉 ) espacial, é bem possível ter contribuido para a evolução. Acho q era tb isto q o Dário queria dizer 😉

    No entanto, a verdade é q até hoje não se detectaram ainda microorganismos vindos do espaço… 😉

  4. Hum… de HIV só sei o básico, mas tanto quanto sei não funciona bem assim, até porque uma simples lavagem de esperma permite a portadores do vírus terem filhos sem a doença. O HIV infecta essencialmente linfócitos T CD4+, não afectando a linha germinativa. Os espermatozóides e óvulos não possuem à partida o genoma do HIV incorporado. Outros retrovírus talvez se enquadrem melhor na ideia que querias transmitir.

    Realmente nós temos sequências no nosso DNA de vírus que infectaram os nossos antepassados. Os elementos transponíveis do nosso genoma, como os retrotransposões, assemelham-se muito a sequência de vírus degeneradas (quase metade do genoma humano é feito de retrotransposões). Os elementos transponíveis ajudam a criar variabilidade genética, tendo assim um papel na nossa evolução. Pensa-se até que um vírus influenciou a evolução da placenta nos mamíferos (http://web.expasy.org/spotlight/back_issues/050/)

  5. Olá,

    Ou seja, estás a dizer que a vida pode evoluir normalmente na Terra sem precisar receber qualquer semente de vida vinda do céu?
    Sendo assim, o teu ponto é que não é preciso haver panspermia?

  6. Podemos ver que organismos podem incorporar informação noutros organismos como os vírus. Podemos ver que componentes químicos podem ser incorporados em cápsulas biológicas e criar vantagem como no post da evolução dos vírus. Podemos ainda verificar que algumas mutações fazem uma célula dominar no seu meio em pouco tempo.

    Quando a Terra era jovem, com atmosfera rarefeita, era bombardeada com mais raios UV. Algumas células podem ter evoluído com o “empurrão” de mutações por UV. Uma componente quimica pode ter sido incorporada numa vesícula de forma a dar vantagem a alguma célula no seu meio. Estes componentes ou estas vesículas podem ter vindo de fora da Terra.

    Estes são alguns exemplos de como a vida pode evoluir de formas diferentes. Não é necessário haver uma estrutura bem organizada para poder desencadear vida. Pode haver uma estrutura precária mas que pode ser incorporada por uma vesícula simples. Pode ainda haver mutações que permitam a produção de algum elemento ou a capacidade de “caçar” outras vesículas.

    Pretendi chegar a esse ponto. Não fui claro. Fui mais perceptível agora ou é uma tolice esta linha de pensamento? Achei que fosse interessante esta ideia, mas não me fiz entender de forma clara mas espero já o ter sido. :op

  7. Olá Dário,

    Sou-te sincero. Não percebi a ligação à panspermia.
    Onde está essa ligação? 😛

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