3200 Faetonte: um asteróide com dupla personalidade

Phaethon_STEREO_AFaetonte e a sua cauda, numa imagem obtida pelo instrumento SECCHI HI do observatório STEREO-A.
Crédito: Jewitt, Li, Agarwal /NASA/STEREO.

3200 Faetonte revelou, recentemente, a sua natureza única, ao exibir uma cauda semelhante à dos cometas. Imagens obtidas pelo observatório STEREO-A, nas proximidades do periélio, mostram um fluxo de partículas de poeira a serem projectadas do asteróide na direcção anti-solar. Estas observações e as respectivas interpretações foram apresentadas ontem pelo astrónomo David Jewitt no Congresso Europeu de Ciência Planetária 2013, em Londres.

Faetonte é um asteróide com cerca de 5 quilómetros de diâmetro, pertencente ao grupo Apolo (objectos com órbitas que cruzam a órbita da Terra), e um membro provável da família Palas, asteróides carbonáceos primitivos ricos em compostos orgânicos voláteis. Com uma órbita extremamente alongada, Faetonte atravessa com regularidade as órbitas dos quatro planetas interiores do Sistema Solar (Mercúrio, Vénus, Terra e Marte), atingindo o periélio a apenas 0,140 UA. A tão curta distância do Sol, a superfície do asteróide aquece até temperaturas próximas dos 750ºC.

Os astrónomos cedo se aperceberam que a órbita de Faetonte está dinamicamente associada aos enxames de meteoróides progenitores das Geminidas, e a um grupo de pequenos asteróides conhecido por Complexo Faetonte-Geminidas (CFG). As Geminidas ocorrem anualmente em Dezembro, e contam-se entre as mais espectaculares chuvas de estrelas observadas nos céus terrestres. A maioria das chuvas de estrelas têm uma origem cometária, mais concretamente na perda de massa pelo núcleo cometário, através da sublimação do gelo das camadas mais superficiais. Faetonte é dinamicamente um asteróide, o que levanta questões quanto aos mecanismos envolvidos na formação dos enxames de meteoróides responsáveis pelas Geminidas.

Geminidas_Pendleton_Thomas_W_EarleGeminidas sobre Pendleton, no Oregon, EUA.
Crédito: Thomas W. Earle.

Duas décadas de observações passaram sem qualquer indício de actividade em Faetonte, que pudesse esclarecer o mistério das Geminidas. A sorte mudou, porém, em 2010, quando Jewitt e colegas notaram um aumento anómalo do brilho do asteróide nas proximidades do Sol. A chave do sucesso foi usar o STEREO-A, um observatório espacial que monitoriza o Sol, para realizar observações impossíveis de concretizar com outros telescópios. Imagens obtidas em 2009 e 2012 confirmaram a presença de uma cauda em Faetonte, nas proximidades do periélio.

“A cauda dá-nos evidências incontestáveis que Faetonte ejecta poeira”, afirmou Jewitt. “Isso deixa ainda uma questão: porquê? Os cometas fazem-no porque contêm gelo que vaporiza pela acção do calor do Sol, criando um vento que sopra partículas de poeira do núcleo. A passagem de Faetonte mais próxima do Sol é equivalente a apenas 14% da distância média entre a Terra e o Sol (1 UA). Isso significa que Faetonte atingirá temperaturas superiores a 700ºC – demasiado quente para o gelo sobreviver.”

A equipa sugere que as partículas de poeira da cauda poderão ser libertadas a partir de fracturas na superfície de Faetonte formadas pelo stress térmico a que o asteróide é sujeito no periélio. Estas partículas não terão mais de 2 µm de diâmetro, pelo que sofrem rapidamente a influência da pressão de radiação exercida pela luz solar, projectando-se no espaço sob a forma de uma cauda anti-solar.

Será, então, Faetonte um cometa ou um asteróide? “Pela forma da sua órbita, Faetonte é definitivamente um asteróide”, disse Jewitt. “Porém, ao ejectar poeira, comporta-se como um cometa de rocha.”

Podem ler mais sobre este trabalho aqui.

7 comentários

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  1. Obrigado pela explicação sobre esta cauda da Faetonte, cusioso mesmo.
    Então a formação dessa cauda talvez se deva impactos né, mas de uma maneira muito rara e que provocaria esta situação.

    Então hoje parece ser meu dia da humildade, primeiro em reconhecer esse fenômeno da Faetonte (que não tinha em mente essa possibilidade) e também agora que vc diz que já existe “Sistema de classificação de corpos celestes, regulamentado pela União Astronómica Internacional”.

    Se não for pedir demais poderia me passar alguma informação a este respeito, neste tópico aqui mesmo?

    1. Xevious,

      Peço-lhe que leia com atenção o artigo. A formação da cauda não se deve a impactos, mas sim à libertação de partículas “a partir de fracturas na superfície de Faetonte formadas pelo stress térmico a que o asteróide é sujeito no periélio”. Está lá em cima, no texto.

      Quanto à classificação de corpos celestes, existem divisões e grupos de trabalho dentro da União Astronómica Internacional para a sua nomenclatura. Para serem submetidos à apreciação desses grupos, os objectos têm de cumprir um conjunto de critérios. Tem aqui algumas definições adoptadas pela UAI para diferentes corpos celestes: https://www.iau.org/public/themes/naming/.

      1. Obrigado pela informação sobre as classificações atuais dos astros.
        Apesar de que isto não chega a me satisfazer quanto a informação sobre um astro relativo a sua classificação.
        E ainda que a informação da orbita tem uma importância maior doq a constituição do astro.

        Eu cheguei a formalizar melhor aquela minha sugestão que fiz naquele dia.
        Disponibilizei ela aqui => http://fisica2100.forumeiros.com/t1309-proposta-de-classificacao-para-astros

        Mas pensando melhor, acho que minha proposta pode ser exagerada.
        Ela contem uma Letra para uma classificação e outra para uma sub-classificação.
        Acho que essa segunda letra poderia ser dispensável.

  2. Claro que é interessante, mas caudas também são comuns. Mercúrio tem e me parece que Vênus também e a Terra também tem pelo menos uma magnética.
    Provavelmente é uma característica de todo astro que tenha atmosfera..

    Por isso que falo que a ideia de considerar astros por tipos é uma ideia arcaica, ou melhor não técnica, uma forma que deveria ser falada só por leigos.
    Mas também compreendo que estou apenas colocando um anseio de maneira antecipada, creio que com o tempo cada vez mais pessoas pensarão como eu e logo teremos uma nova forma de nos referirmos aos astros.

    Para mim, temos só que nos ater as características dos astros, e não dizer que ele é de um tipo ou outro.

    A pouco tempo foi colocada uma matéria de sugestão para classificação para os planetas, sinto que ela veio até tardiamente mas também ainda acho que é uma classificação só intermediária, precisamos de uma “total’.

    E considerar algo que orbite, e que tenha desde o tamanho de uma bola de basquete, até o tamanho a Canis Majoris(mas eu já consideraria o limite algo 1000x maior..)

    1. Olá Xevious,

      Já discutimos a questão dos sistemas de classificação. Volto a sublinhar que, embora com imperfeições, estes sistemas são fundamentais em ciência.

      Quanto à questão da cauda de Faetonte, vale a pena recordar que este é um pequeno corpo rochoso sem atmosfera, pelo que a presença da cauda é deveras surpreendente. Na verdade, este é o único asteróide até agora observado com este comportamento. 😉

      1. Sim Sérgio já discutimos sobre as classificações versos tipificações.. mas isso não significa que não se possa retornar ao tema, certo?
        (ao meu ver surgirão cada vez mais motivos para passarmos a adotar classificações em vez de tipificações)

        Ah, deixa explicar, o conceito atual considero como TIPIFICAÇÂO.
        Ou seja, se considera que certo astro seja de um determinado TIPO.

        Por exemplo, Ganimedes é uma Lua, já que orbita um planeta
        Já Mercúrio, que é menor que Ganimedes é um planeta, pois orbita uma estrela e não um planeta.

        Classificaçao, pra mim, siginifica classificar os astros de acordo com suas características.
        E com isso a importância de onde esta o astro em termos de orbita diminui.
        E também uma classificação pode dar muito mais informação doq apenas seu tipo.

        A classificação sugerida dos planetas de acordo com sua temperatura, já é um passo neste sentido.
        Mas creio que isto deva ser ampliado.

        Mas voltando ao caso do Faetonte.

        Uma coisa me parece ilógico neste seu comentário.
        É o fato de ter uma cauda e não ter atmosfera..

        Creio que o conceito de atmosfera, deva ser considerado de uma forma mais abrangente doq o usual e então considerar que SIM este asteroide tem algum tipo de atmosfera.

        Mas se existe uma explicação para um asteroide ter cauda sem ter atmosfera, gostaria de saber..

      2. Olá, Xevious
        Volto a repetir: existe um sistema de classificação de corpos celestes, regulamentado pela União Astronómica Internacional . Este sistema baseia-se nas características físicas e nos parâmetros orbitais de cada objecto. Ou seja, não é uma mera “tipificação”. 😉

        Ao contrário do que sugere, os parâmetros orbitais são importantes. O facto de um objecto orbitar um planeta tem fortes implicações na sua geologia. Veja, por exemplo, o caso de Io. A influência gravitacional de Júpiter e das outras três grandes luas jovianas produz intensas deformações no seu interior, o que tem como consequência a extrema actividade geológica observada em toda a sua superfície. Verificam-se estes e outros efeitos noutras luas do Sistema Solar, incluindo Ganimedes.

        Quanto à classificação dos planetas pela temperatura é uma proposta interessante, mas serve apenas os planetas telúricos. Por outro lado, nada nos diz acerca da sua composição, e apenas cumpre o propósito de catalogar os planetas de acordo com o seu índice de habitabilidade segundo os parâmetros terrestres. 😉

        Por fim, voltamos a Faetonte e à sua cauda. Faetonte tem uma cauda e não uma atmosfera (a explicação para a presença de uma cauda em Faetonte está no texto em cima). Por definição, uma atmosfera é um conjunto de camadas gasosas com diferentes propriedades, que envolvem um corpo celeste, e onde as moléculas que a constituem estão gravitacionalmente ligadas a esse corpo. A pequena cauda exibida por Faetonte é constituída apenas por pequenas partículas. Nem sequer existe uma exosfera a rodear Faetonte (a exosfera difere da atmosfera pela inexistência de colisões entre as moléculas que a constituem, ou seja, na exosfera não existe verdadeiramente um gás). Mesmo nos cometas, chamar atmosferas/exosferas aos envelopes gasosos que os rodeiam é forçado, porque a sua ligação gravitacional é demasiado ténue.

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