Pensamento positivo pode ser prejudicial

Crédito: Dirk Anschutz/Getty.

Crédito: Dirk Anschutz/Getty.

Sou um defensor do pensamento positivo.
Sobretudo após ter emigrado, passei a detestar as conversas em que as pessoas estão-se sempre a queixar da vida, em que estão sempre a colocar a culpa nos outros (seja o governo, as leis, a sorte, isto e aquilo), em que passam a vida em lamúrias inúteis (porque não têm resultados práticos).
Passei a tentar seguir a ideia que se deve fazer algo para se feliz, que se queremos mudar algo devemos fazer por essa mudança, que a mudança não está nos outros (seja Governo, leis, etc) mas sim em nós próprios, e que se pensarmos positivamente sobre algo (incluindo a nossa vida) temos maior probabilidade de atingirmos aquilo que desejamos.
Claro que isto é somente uma crença minha (sim, também as tenho. Tenho várias: a ideia de Karma é outra crença).

Claro que podemos argumentar que a crença até tem razão de ser, já que alguns estudos mostram que o nosso pensamento positivo poderá ter alguns efeitos positivos sobre o nosso corpo, na forma de placebo.

Paradoxalmente, não sou um seguidor de livros de auto-ajuda, palestradores motivacionais, etc. Isso é tudo muito positivo (sobre em termos de contas bancarias), para quem vende esse tipo de coisas. Para as pessoas que vão atrás, a única coisa que precisam saber é que não é com livros ou palestras que vão lá, mas a mudança de pensamento está nelas.

Apesar de ser um defensor do pensamento positivo, adorei este artigo do The New Yorker.
O artigo diz-nos que alguns estudos mostraram que pensamento positivo pode ser prejudicial. O pensamento positivo pode conduzir-nos ao insucesso.
Primeiro, porque o pensamento positivo deixa-nos menos preparados para o insucesso. Quando as coisas não resultam da forma que queremos, ficaremos frustrados e sem saber como lidar com essa negatividade.
Por outro lado, pensar continuamente de forma positiva leva-nos a imaginar que estamos mais perto dos objetivos do que realmente estamos. Isso faz com que tenhamos uma visão deturpada da realidade, e sobretudo faz com que relaxemos na procura por esse objetivo.

Apesar de ser evidência anedótica, é fácil perceber que grande parte das pessoas têm ideias fantásticas sobre aquilo que gostariam de fazer na vida (sobretudo quando estão na faixa etária entre 10 e 30 anos), mas depois percebe-se que ficam-se só pelas ideias. E passam pela vida contentes com isso, só pelo pensamento positivo, só pelas ideias fantásticas, mas sem nunca as concretizarem.
São pessoas com pensamento positivo, mas que ficam contentes por esse pensamento positivo ser um fim em si próprio, em vez de ser um meio para concretizar algo real.

Kappes defende que as fantasias podem ser úteis se não conseguimos satisfazer determinada necessidade. Por exemplo, se uma pessoa passa fome, é bom que ela fantasie com grandes banquetes, porque a fantasia leva-a para um mundo que a faz esquecer temporariamente as privações da vida real. Star Trek, por exemplo, pode ser uma fantasia aceitável, já que no decurso da nossa vida não teremos passeios diários pela galáxia com aventuras fantásticas semanais, mas o facto de fantasiarmos com isso faz-nos “deixar este mundo” e pensarmos coisas mais além. As fantasias são positivas se for sobre algo que sabemos que nunca conseguiremos concretizar na vida real (tem que ser algo mesmo “do outro mundo”, e não algo que até podemos concretizar se não arranjarmos desculpas/justificações para não o fazer).

Oettingen defende que as fantasias podem ser úteis, se além da fantasia (pensamento positivo) a pessoa também planear todos os passos para a concretizar. Ou seja, se a pessoa se deixar de desculpas/justificações e colocar “mãos-à-obra” para ultrapassar as barreiras e ter sucesso.

E este é que me parece o ponto principal de tudo isto.
A pessoa não se pode ficar somente pelo pensamento positivo, mas tem que ter comportamentos de modo a concretizar aquilo que pensa.

Ou seja, não se deve preconizar somente uma mudança de pensamento (para positivo).
Todos, mesmo aqueles que já pensam de forma positiva, têm que defender sobretudo uma mudança de atitude perante a vida. Não basta querer algo, mas é crucial fazer por ter esse algo.

5 comentários

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  1. Partilho 100% da opinião do autor quanto às pessoas que se queixam dos seus insucessos colocando a responsabilidade em factores externos. Normalmente não fazem absolutamente nada para mudar a sua vida, tentando melhorá-la.

    Mas concordo que o pensamento positivo sem os pés no chão pode levar a voos muito altos dos quais se cairá mais tarde. E pensamento negativo também é algo que não contribui para sucesso nenhum, apenas aumenta a ansiedade, etc.

    Isto são pensamentos em relação a situações futuras. Acho que o importante é (também) olhar para o passado e usar a aprendizagem obtida em situações idênticas, para construir um pensamento aberto e necessariamente mais perto da realidade em relação ao futuro.
    Porque o verdadeiro lado positivo no meio disto tudo é a aprendizagem que se vai retirar do que acontecer construída em cima do que já se aprendeu antes. Acho eu. 🙂

    Excelente espaço, este blogue!
    Abraço e perdoem o tamanho do comentário.
    Susana

  2. Penso que outro efeito adverso do pensamento positivo é a assunção de riscos em excesso. Por exemplo, no mundo das finanças ou dos negócios: o pensamento positivo pode levar alguém a fazer determinado investimento ousado, que tem poucas chances de real sucesso, simplesmente porque “está confiante” de que funcionará.

    Aliás, li em algum lugar (infelizmente não me recordo onde) um interessante texto que afirma que o sucesso de filmes como O Segredo (The Secret) ou Quem Somos Nós (What the Bleep Do We Know) pode ter contribuído para causar as mais recentes crises econômicas, justamente porque tais filmes defendem, em linhas gerais, que tudo dará certo se você tiver pensamento positivo, levando as pessoas em geral a correr riscos que normalmente não correriam.

    1. Interessante 😉

    • Graciete Virgínia Rietsch Monteiro Fernandes on 03/03/2014 at 13:55
    • Responder

    Sobre pensamento positivo eu tenho a ideia de que é caraterístico de quem não se deixa acabrunhar pelas dificuldades e tenta um caminho para a saída. Só que também acho que as circunstâncias, por vezes, são tão adversa que o caminho não se encontra. Um exemplo muito corriqueiro. Que interessa um pensamento positivo quando se tem fome e não se tem dinheiro para comprar comida? Sobre o Karma, aquilo de que tenho conhecimento, é inaceitável, para mim. Mas posso estar enganada. Terei que pesquisar mais.
    Um abraço.

  3. Eu já penso que tanto o otimista quanto o pessimista vivem fora da realidade. Acho que o melhor é adotar um caminho que fique no meio, entre esses dois extremos.

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