Deteção de Exoplanetas: Introdução ao método do Trânsito

À esquerda, o trânsito de Vénus, um pequeno ponto negro sobre o disco solar. À direita, no início do trânsito, é possível observar uma diferença de cor no disco estelar (escurecimento do limbo), bem como um círculo avermelhado que envolve o planeta (atmosfera). Fonte: Wikipédia.

Quando um planeta orbita a sua estrela, pode dar-se o caso deste atravessar o disco estelar na direção do observador. Se isso acontecer, dará origem a um evento chamado trânsito, caracterizado por uma ligeira diminuição do brilho da estrela durante a travessia, que nos permitirá obter alguns parâmetros do sistema planetário. À passagem do exoplaneta por trás da estrela, dá-se o nome de ocultação.

Este conjunto de artigos irá abordar pormenorizadamente todos os aspetos relacionados com o trânsito, habilitando o astrónomo amador a efetuar as suas próprias deteções, quer de exoplanetas já descobertos quer de outros por descobrir.

Como os planetas do nosso sistema solar estão bem alinhados no plano orbital, da Terra podemos observar trânsitos dos planetas interiores: Mercúrio e Vénus, tendo este último sido utilizado no passado para compreendermos melhor o sistema solar. E é desta forma, estudando trânsitos de planetas extrassolares que poderemos deduzir os seus sistemas planetários.

A alteração do fluxo estelar durante um período orbital irá determinar a configuração do trânsito que ocorre em dois momentos críticos:

  • durante o trânsito, quando o planeta passa à frente da estrela; e
  • na ocultação, quando o planeta passa atrás da estrela.

Como veremos mais adiante, estes 2 momentos permitem-nos obter informações sobre o sistema.

Representação esquemática do método do trânsito.
Fonte: adaptação de http://arxiv.org/pdf/0807.4929v2.pdf, Joshua N. Winn, 2008

Dado que um trânsito é uma configuração específica dum planeta em órbita duma estrela, que só acontece se este estiver alinhado com a nossa linha de visão, então podemos definir uma zona na qual um planeta criaria uma sombra na estrela, quando iluminado a partir do observador e, se esse planeta estiver lá, então teremos um trânsito. A zona de sombra depende da proximidade do planeta. Assim, se este estiver mais próximo da estrela, a zona de sombra será maior; se estiver mais longe, será menor. Por outras palavras, a probabilidade do trânsito depende da distância à estrela.

Geometria da zona de sombra. Fonte: http://inspirehep.net/record/842679/plots, Joshua N. Winn.

Para órbitas circulares, a probabilidade do trânsito pode ser definida como a razão entre o raio da estrela (acrescida da soma do raio do planeta, embora possamos desprezar este contributo) e a distância orbital. Dado que a probabilidade do trânsito aumenta com a excentricidade orbital, torna-se necessário ajustar o resultado anterior introduzindo um novo fator.

Expressões da probabilidade do trânsito e da ocultação.

A probabilidade do trânsito para a Terra é de 0,5% e este resultado mostra-nos que teríamos de observar cerca de 200 planetas semelhantes ao nosso para encontrarmos um trânsito, o que faz com que seja um evento muito raro.

No entanto, se a sua órbita fosse muito excêntrica (por exemplo: e = 0,95), a probabilidade do trânsito aumentaria para 5,1%.

Todavia, a maior probabilidade não se encontra nos planetas com órbitas excêntricas mas sim em Júpiter quentes. Estes planetas orbitam as suas estrelas a distâncias muito mais próximas que Mercúrio em relação ao Sol, com semieixos de 1/20 UA, o que se traduz em probabilidade do trânsito na ordem dos 10%. Agora, já não necessitaríamos de observar 200 estrelas mas apenas cerca de 10.

E foi isso que aconteceu, à 6ª tentativa de deteção de trânsitos em exoplanetas já conhecidos pelo método da velocidade radial, surgiu a confirmação na estrela HD 209458, ou seja: o exoplaneta HD 209458 b possuía uma órbita alinhada com a nossa linha de visão.

No próximo artigo irei descrever o trânsito nas vertentes qualitativa e quantitativa.

5 comentários

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  1. Maravilha!

    1. Obrigado Luís.

  2. A detecção de exoplanetas é restrita apenas ao método do transito e ocultação? Há outras formas de detecção?

    1. Estevão,

      Em complemento à resposta do Carlos Oliveira, realço que o método do trânsito é o único ao alcance do astrónomo amador (e no artigo anterior mostrei como isso pode ser feito).

      Ao longo desta série, irei abordar praticamente todos os métodos.

      Abraço.

  1. […] Para se detectar e medir o ligeiríssimo decréscimo de luminosidade que o trânsito de um planeta de tamanho semelhante à Terra induz ao orbitar uma estrela semelhante ao nosso Sol e situada a dezenas, centenas ou milhares de anos-luz de distância, já é necessário sair desta camada de gases a que chamamos atmosfera e que cria ruído suficiente para contaminar qualquer tentativa de o encontrar. Por esta razão, a Nasa colocou em órbita, em 2009, o telescópio Kepler. Além do método de trânsito, o desenvolvimento de espectroscópios cada vez mais precisos, levou também à descoberta de planetas por um outro método: a velocidade radial. A contagem de planetas extrassolares, ou exoplanetas, já passou a marca dos 3500 (para quem quiser saber mais há uma série de artigos do Ruben Barbosa aqui no AstroPT). […]

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