Telescópio tentará observar o Buraco Negro Super-Maciço no centro da Via Láctea no início de Abril

No início do próximo mês, uma equipa de astrónomos vai tentar realizar uma das mais espectaculares observações da história da astronomia: obter imagens do buraco negro super-maciço que habita o centro da nossa galáxia, a Via Láctea. A equipa usará um instrumento pouco convencional designado por Event Horizon Telescope. Na verdade não se trata de um telescópio normal mas antes um conjunto de radiotelescópios espalhados por vários locais do mundo cujas imagens, combinadas com uma técnica conhecida por VLBI (Very Long Baseline Interferometry), lhe permitem atingir uma resolução semelhante à de um radiotelescópio com o tamanho da Terra. O Event Horizon Telescope seria capaz de descortinar um objecto do tamanho de uma moeda de 1€ situado à distância da Lua!

O South Pole Telescope, de 10 metros, localizado na Estação Amundsen-Scott no Pólo Sul, é um dos radiotelescópios que fazem parte do Event Horizon Telescope. As observações serão realizadas em comprimentos de onda milimétricos para conseguir penetrar nas densas nuvens de gás e poeira interestelar que se situam na nossa linha de visão com o centro da Via Láctea.
Crédito: Dan Marrone / Universidade do Arizona

O buraco negro no centro da Via Láctea, um objecto conhecido por Sagittarius A* entre os astrónomos, tem uma massa de cerca de 4 milhões de sóis. A massa foi estimada de forma robusta observando o movimento de dezenas de estrelas que o orbitam numa dança tão elegante quanto perigosa. Mas os buracos negros são objectos muito compactos. Apesar da sua massa, o tamanho do Sagittarius A*, isto é, o diâmetro do seu horizonte de eventos, a superfície de não retorno, é de apenas 24 milhões de quilómetros, metade da distância entre o Sol e Mercúrio, ou 17 vezes o tamanho do Sol. Parece muito, mas o problema é que se encontra a cerca de 26 mil anos-luz!

(Animação mostrando as trajectórias de várias estrelas e uma nuvem de gás ionizado, em torno do Sagittarius A*. O vídeo foi feito com base em observações recolhidas por astrónomos ao longo de vários anos consecutivos. Crédito: ESO.)

Um tal desafio observacional levou os astrónomos a desenvolver, ao longo de vários anos, o Event Horizon Telescope, composto por estações na Antártida, no Chile, no Hawaii, na Espanha, na França, no México e no Arizona. A recente adição do Atacama Large Millimeter Array (ALMA), no Chile, e o South Pole Telescope (na Antártida) aumenta consideravelmente o seu poder de resolução e, especialmente, a sua sensibilidade. Os testes realizados com esta infraestrutura sugerem que, finalmente, o EHT está pronto para observar o Sagittarius A*. Uma série de restrições técnicas e astronómicas limitam as observações a uma janela entre os dias 5 e 14 de Abril.

Nesta imagem simulada (esquerda) Sagittarius A* funciona como uma lente gravitacional fazendo a luz emitida por material que o orbita formar um anel em torno da silhueta negra do horizonte de eventos. O anel é mais brilhante do lado em que o material se aproxima de nós, e mais débil do lado em que se afasta, devido a um efeito de Doppler extremo. À direita está uma imagem do que se espera ser observado pelo Event Horizon Telescope.
Fonte: http://www.scintillatingastronomy.com/eht/

A recolha e processamento dos dados levará vários meses, tal é a complexidade destas observações. Os resultados deverão ser conhecidos, na melhor das hipóteses, no final do ano ou mesmo já em 2018. No final, os astrónomos esperam conseguir obter uma imagem de um anel brilhante luminoso de luz, focada na nossa direcção pela lente gravitacional formada pelo buraco negro. A luz é proveniente de material a elevada temperatura que orbita o buraco negro a grande velocidade. As simulações sugerem que o anel deve ser mais luminoso no lado em que a luz é produzida por material que orbita o buraco negro em direcção à Terra, e menos brilhante do lado em que o material se afasta, devido ao efeito de Doppler que é, nestas circunstâncias, extremo. Sagittarius A* não será visível directamente, afinal não emite luz, mas a sua silhueta elipsóide negra deverá ser evidente na imagem. Será a primeira imagem de um buraco negro e a prova definitiva de que estes objectos superlativos, previstos pela Teoria da Relatividade Geral, realmente existem. A detecção, há cerca de um ano, de ondas gravitacionais com a assinatura característica de uma colisão de buracos negros torna a sua existência quase certa. No entanto, uma imagem seria uma prova irrefutável.

Referência:This global telescope may finally see the event horizon of our galaxy’s giant black hole”. Daniel Clery. Março 2017. Science.

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