Mosquitos relativos

Infelizmente, ainda sofremos bastante daquilo a que chamo geocentrismo psicológico: avaliamos tudo sempre sob o nosso ponto de vista.

Isto vê-se muito quando pensamos em vida extraterrestre, quer em ciência quer sobretudo na ficção científica, como tenho criticado bastante. Seres Humanóides, que necessitam de água, oxigénio, etc, e que têm as mesmas atitudes, comportamentos, desejos e sentidos dos Humanos não são verdadeiramente alienígenas.

Mas também quando comparamos com vida terrestre: avaliamos os outros seres sempre sob uma perspetiva humana.
Em face da enorme diversidade que existe na Terra, seria como se uma formiga no deserto do Sahara imaginasse que toda a vida terrestre tivesse que ser como ela.

Quando acreditamos (crença) em vigarices pseudocientíficas, assumimos sempre que temos um lugar especial na organização do Universo (ex: a astrologia coloca a Terra no centro do Universo e coloca os seres Humanos como os recetores de tudo o que se passa no Universo – o Universo só existe para nos afetar).
O mesmo se passa com a religião: somos o centro da atenção de seres supostamente criadores de todo o Universo ou de espíritos de outras dimensões.

Na temática dos UFOs, que mistura astrobiologia, religião e pseudociência, o mesmo se passa: seres supostamente muito avançados que viajam entre estrelas, têm tecnologia humana do século XX e visitam o planeta precisamente na altura (em 4,6 mil milhões de anos) em que existem humanos (porque somos muito especiais).

Até nas palavras que utilizamos, somos bastante geocêntricos. Por exemplo: nascer-do-sol ou pôr-do-sol.


Simultaneamente, colocamos o ser humano como o mais importante do Universo, mas também desresponsabilizamos o ser humano.
Se os “outros” (seres extraterrestres, seres vivos terrestres, etc) forem como nós, então não temos de pensar neles como diferentes de nós, não temos de pensar noutras formas de ser estranhas a nós próprios;
Simultaneamente, na pseudociência, religião, etc, temos uma enorme desresponsabilização das nossas ações e culpamos outras entidades (deuses, seres malignos, energias desconhecidas, etc).
Assim, continuamos com uma mentalidade de criança (sem pensar nos outros como entidades próprias e sem nos responsabilizarmos pelas ações): os seres Humanos não cresceram mentalmente.

Este Tweet critica isso: quando vamos de carro e um mosquito morre contra o vidro da frente do carro, pensamos imediatamente que a “culpa” foi do mosquito, que veio contra o carro; quando na verdade foi a velocidade do carro que foi contra ele: não nos responsabilizamos pelo sucedido nem pensamos no mosquito como um ser autónomo que evoluiu durante milhões de anos sem ter carros ao redor.


O Princípio da Mediocridade começou o seu renascimento há cerca de 500 anos, e desde aí tem prosperado imenso cientificamente… exceto nas nossas mentes geocêntricas.

Xenophanes, em 500 a.C., dizia sarcasticamente que se as vacas e os cães tivessem mãos, desenhavam os deuses (ou aliens) à sua imagem.

2500 anos mais tarde, o filósofo Ludwig Wittgenstein afirmou que se um leão conseguisse falar, nós não o compreenderíamos, porque ele “vê” o mundo de uma forma diferente da nossa (com desejos e sentidos diferentes dos nossos).

Mais recentemente, David Zindell escreveu em Neverness que nós não vemos as coisas (ou seres) como elas são, mas sim como nós somos.


Incrivelmente, apesar de sabermos desta nossa limitação há milhares de anos, continuamos a persistir nos mesmos erros…

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