Filosofia – crash course (1)

Dou aqui começo a uma série de artigos que se irá focar num mini-curso de Filosofia. Porquê Filosofia num blogue de Ciência? Creio que qualquer pessoa que tenha interesse em Ciência terá também interesse nos métodos lógicos do pensar, o que significa que também gostará de Filosofia, ainda que possa ainda não ter descoberto esta paixão. Sendo assim, creio que é justificado escrever esta série de artigos onde irei pisar um pouco os campos da Filosofia usando os meus sapatos formatados pela Física, Matemática e Neurociências.

O plano é comentar o Crash Course sobre Filosofia disponível no youtube, um “mini-curso” que gostei bastante de acompanhar aqui há uns anos atrás. Comecemos pelo primeiro episódio:


(Note que pode adicionar legendas em português nas opções do vídeo, caso necessite. Faço ainda notar que os meus comentários abaixo não são necessariamente críticas ao vídeo. Compreendo que dado o formato do Crash Course seria inevitável fazerem muitas asserções questionáveis e/ou incompletas. Convido-o a si também a partilhar as suas opiniões nos comentários abaixo.)

Logo no primeiro minuto é insinuado que a Ciência não pode responder a certas questões. Neste ponto creio que é importante fazer uma distinção entre a actualidade do conhecimento científico e o potencial que a Ciência tem para saber mais. Por um lado, é claro que a Ciência ainda não sabe responder a muitas questões. Por exemplo, como é que o nosso cérebro produz o nosso Eu e porquê? Por outro lado, é difícil estabelecer o que é passível de ser compreendido pela Ciência e o que é que não é. Até que se prove o contrário, creio que a atitude correcta é a de assumir que a Ciência poderá eventualmente responder a qualquer pergunta que faça sentido. Determinar se uma dada questão faz ou não sentido talvez seja uma tarefa da Lógica, a qual tanto pode ser considerada como sendo um domínio da Filosofia como da Matemática. (Na minha opinião, a Matemática é uma forma de Filosofia analítica.) Assim, concordo que de facto há questões que podem sair do domínio da Ciência, como sejam estas de carácter epistemológico. Não concordei foi muito com os exemplos dados no vídeo. Em particular, o problema do livre arbítrio que é mencionado poderá ser analisado e compreendido pelas neurociências do futuro. É possível que se venha a mostrar que de facto o livre arbítrio não existe (discuti um pouco esta questão e as suas implicações neste artigo).

Por volta do minuto quatro, o Hank apresenta alguns exemplos de questões sobre as quais a Filosofia se tem debruçado. A primeira que é de certa forma anti-científica é a que concerne Deus: existirá um Deus? Chamo-lhe “anti-científica” porque parte de uma não-observação física. Mais adiante, surge uma outra: teremos alma? No artigo “a alma está morta” já discuti o porquê destas questões não serem científicas. Aliás, tenho dúvidas que sejam questões filosóficas legítimas. Por outras palavras, será que sem uma motivação teológica, social e/ou histórica, estas questões seriam colocadas pela Filosofia percorrendo a sua linha “natural” de sucessivas interrogações lógicas? Não obstante, reconheço que é de certo legítimo à Filosofia questionar qualquer conceito que tenha ao dispor, independentemente da sua origem, tanto mais não seja para demonstrar ou sugerir que o conceito em causa é absurdo ou injustificado.

Ao minuto cinco discute-se o que é a “verdade”, que é uma questão extremamente pertinente a qualquer campo do conhecimento. Tentamos saber mais, mas não é de todo claro como determinar se algo é “verdade”. Sendo assim, será a procura por conhecimento uma perda de tempo? Discuti um pouco destas questões no artigo sobre as suposições da humanidade.

Por volta do minuto sete é finalmente mencionada a Lógica, a base da Filosofia e também de todas as Ciências e Matemáticas. Será que se irá abordar num episódio futuro o porquê de supor que a Lógica é “verdadeira”? Como poderemos analisar a questão sem usar a própria Lógica, tornando a questão redundante?

Fico-me por aqui, antevendo que as próximas “aulas” irão de certo aprofundar algumas das questões mencionadas neste primeiro episódio, pelo que deixo discussões mais detalhadas para artigos futuros.

 

Introdução à Metafísica
A frase de baixo é verdadeira.
A frase de cima é falsa.

3 comentários

  1. Sem dúvida, Jonathan Malavolta.

    Caro Alberto, recomendo que use o espírito aberto da Ciência para continuar a ver esta pequena série sobre Filosofia, a qual poderá por ventura mudar a sua opinião. Reconheço, aliás, que quando era mais novo partilhava em parte um pouco da sua opinião, mas agora vejo que estava demasiado focado nos desígnios da Ciência. A Filosofia não pretende responder a questões científicas, para isso existe a Ciência…

    Não obstante, é verdade que se faz muita Filosofia que é de facto lixo, particularmente quando se tenta de facto enveredar em questões científicas. Mas isso não é único na Filosofia… Também na Ciência há imenso lixo (eventualmente a esmagadora maioria da Ciência que se faz hoje em dia é lixo).

    Cumprimentos,
    Marinho

  2. Na real toda a Filosofia é um grande lixo cósmico, uma tremenda perda de tempo, até para essas situações de lógica. A ciência trabalha com verdade com métodos eficazes.

    Se colocarmos tudo o que foi dito pelos filósofos numa análise investigativa do que funcionou (acertaram) ou não, praticamente quase tudo é lixo. E o que alguns acertaram, foi mais chute do que uma descoberta com comprovação.

    Filosofia foi só uma ponte entre um mundo religioso, cheio de doutrinas e “verdades” imutáveis, para o mundo moderno da ciência que realmente desvela conhecimento de verdade. Filosofia teve a coragem de questionar as verdades religiosas, saiu-se do ostracismo dos tempos preguiçosos e ignorantes das cavernas, mas ela por si gerava mais chutes do que real conhecimento.

    Quando o método cientifico foi inventado, a própria ponte perdeu o sentido de existir e caiu, não tem importância nenhuma no nosso mundo de hoje, é só “conversa para boi dormir”, como se diz aqui no Brasil.

      • Jonathan Malavolta on 01/06/2022 at 20:47
      • Responder

      Só para constar: Se não fosse pela Filosofia, a própria Ciência não teria nascido.
      1 – Devemos à Filosofia o nascimento da lógica e do pensamento crítico, tão importantes para a Ciência;
      2 – Existe uma área denominada Filosofia da Ciência (adivinha em qual faculdade estudamos tal área);
      3 – Muito da discussão científica precisa de uma outra área, também estudada pela Filosofia, para saber se determinado procedimento pode ser aplicado ou se trará mais malefícios e destruição do que benefícios: chama-se Ética.

      Também sou brasileiro, e um amante incorrigível da Ciência. Por ser amante da Ciência, acabei por aprender a reconhecer o valor da discussão filosófica dentro da própria Ciência.

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