36 civilizações avançadas na nossa Galáxia?

No ano passado, foi muito divulgado/partilhado este estudo que prevê a existência de 36 civilizações avançadas na nossa Galáxia.
O artigo científico foi publicado no reputado The Astrophysical Journal, aqui.

Os autores utilizam uma forma simplificada da Equação de Drake, sob 2 cenários: forte e fraco (Limites Astrobiológicos de Copérnico).

A diferença entre o Forte e o Fraco é:
– Forte: as civilizações avançadas desenvolvem-se entre 4,5 e 5,5 mil milhões (bilhões, no Brasil) de anos de evolução da vida.
– Fraco: as civilizações avançadas desenvolvem-se somente após 5 mil milhões de anos de evolução da vida.

Através de somente 3 fatores, eles calculam quantas civilizações com capacidade para comunicarem connosco via rádio-telescópios, existem na nossa Galáxia.
Os factores são: formação de estrelas na nossa Galáxia, quantidade de metais que existem nas estrelas (elementos que formam planetas terrestres), e quantidade de estrelas que podem ter planetas como a Terra nas suas zonas habitáveis.

No cenário forte, com as suposições mais restritas, eles chegaram à conclusão que devem existir pelo menos 36 civilizações na nossa Galáxia com as quais podemos comunicar.
O intervalo nos seus resultados vai desde 4 civilizações a 211 civilizações.

Se as civilizações estivessem distribuídas pela galáxia uniformemente, então a civilização mais próxima de nós poderá estar a 17 mil anos-luz de distância. O que faz com que não as possamos detetar com os métodos atuais.
O intervalo de distância poderá ir entre 7 mil e 50 mil anos-luz de distância.

Pessoalmente, sou muito crítico destes estudos. Ou melhor, eles nem são estudos, são reflexões teóricas interessantes baseadas em alguns números (limitados) que temos.

O que os autores fizeram foi simplificarem a Equação de Drake, praticamente pondo de lado as questões biológicas e sociológicas, e concentrando-se nas questões astronómicas.
Esta é uma forma racional de pensar, já que os fatores astronómicos são os que se conhecem melhor, daí se poder calcular com melhor eficácia (e em dados e não opiniões) os resultados finais.
O problema é que deixa vários fatores de fora, o que faz com que existam demasiadas variáveis que não foram consideradas.

Além disso, mesmo assim, esta reflexão sofre de geocentrismo psicológico, ignorando o Princípio da Mediocridade, apesar de dizerem que se baseiam nele.
Por exemplo, eles assumem que somos muito inteligentes. E a razão para isso, é conseguirmos comunicar por rádio (com satélites, televisões, rádio-telescópios, etc). Isto é um erro! Isto é o mesmo que os nativos americanos acharem que podem comunicar com todos os seres do Universo por sinais de fumo, ou há 150 anos acharmos que podíamos comunicar com todos os seres por telégrafo (tal como aconteceu – existiu quem pensava que todos os seres inteligentes no Universo comunicavam por telégrafo). Continuamos a cometer os mesmos erros. Daqui por 200 anos, poderá/deverá existir uma forma de comunicação muito mais avançada que a rádio-comunicação, e nessa altura, vamos cometer o mesmo erro: vamos arrogantemente pensar que todos os seres inteligentes no Universo comunicam dessa forma.

Uma outra suposição é os autores assumirem que a vida só se desenvolve em ambientes ricos em metais. Ou seja, assume-se que a vida tem que ser mais ou menos como nós.

Outra suposição é que a vida avançada desenvolve-se em planetas semelhantes ao nosso.
Mas o nosso planeta nem sequer era semelhante ao nosso há 4,5 mil milhões de anos atrás.

Por fim, a maior suposição de todas: assumem que a vida inteligente (como nós) tem que se desenvolver em cerca de 5 mil milhões de anos (só porque a nossa demorou esse tempo a desenvolver-se neste planeta).
Existem demasiados fatores na evolução terrestre que permitem perceber que o valor de 5 mil milhões de anos é meramente uma coincidência. Não deve ser utilizado como “pista” para o que pode acontecer noutro local.

Já agora, no sentido contrário, eles utilizam um L (quantidade de tempo que as civilizações avançadas comunicam por rádio) de somente 100 anos. Que é mais ou menos o número de anos em que os Humanos usam a rádio-comunicação.
Ou seja, apesar de utilizarem novamente um valor humano, desta vez parece-me que utilizaram um valor demasiado baixo. Se assumirmos que não nos vamos todos extinguir nos próximos anos, então continuaremos a utilizar a rádio-comunicação durante muitos mais anos.
Aliás, eles próprios dizem que se continuarmos mais 6000 anos a utilizar rádio-comunicação, então nessa altura já conseguiremos conversar (“falar” e “receber a resposta”), com a potencial civilização mais próxima de nós.

Mesmo que os valores estivessem certos, as outras civilizações não vão estar uniformemente distribuídas pela Galáxia.
Mesmo assumindo que os valores possam estar certos, se, por exemplo, 20 delas fizerem parte de um grupo galático, e se encontrem relativamente próximas umas das outras, então nós poderemos estar muito isolados na Galáxia.

Curiosamente, no artigo científico, eles realçam vários constrangimentos no seu raciocínio.
Ou seja, tal como se deve fazer em ciência, eles fazem uma auto-reflexão e percebem que alguns valores podem não ser assim.
Como exemplo, existe o facto da grande maioria das estrelas na galáxia serem anãs vermelhas, que apesar de terem metais e durarem muito tempo, têm planetas muito próximos das suas estrelas e poderão não ter as condições ideais para a vida tal como a conhecemos.

E eles também admitem que assumem que a vida inteligente se forma noutros planetas de maneira semelhante a como aconteceu na Terra.
Ou seja, mais uma vez, e muito bem, eles admitem este geocentrismo no pensamento.

O grande problema disto é que só temos um exemplo: nós.
E achamos que todos os outros têm que ser como nós.

É interessante pensar nestas coisas, mas devemos ter pensamento crítico para não nos deixarmos enganar pelas especulações sensacionalistas que vemos depois que os jornais e redes sociais fazem a respeito destas reflexões.

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